quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

FALTA ABACAVIR EM SÃO PAULO

Querido leitor, falta Abacavir (Ziagen) nas prateleiras de medicamentos dos centros de distribuição de medicamentos do Estado e da Prefeitura na cidade de São Paulo.

O Abacavir é um nucleosídeo análogo e faz parte dos medicamentos que deveriam ser distribuídos gratuitamente pelo Estado. Eu tomo 3 medicamentos: Kaletra, Abacavir e Tenofovir. Infelizmente a retirada de um deles do meu "coquetel" pode resultar em resistência do vírus HIV e posterior aumento de carga viral e queda de células CD4 (são elas que protegem meu organismo contra a ação do HIV e das infecções oportunistas).

Pois é, emprestamos dinheiro ao FMI mas a saúde pública continua sendo deixada de lado. Procurei pela internet de cabo a rabo pra ver se achava alguma notícia consistente ou reveladora sobre este assunto, mas tudo que encontrei foram notícias de que o medicamento iria faltar e ponto final. Ou seja: se virem soropositivos, está em falta e ponto final.

Isso é no mínimo revoltante! Sou cidadão brasileiro como todos vocês, leitores, e fico indignado quando estas coisas acontecem! Desde dezembro que o C. R. Penha na zona leste de São Paulo onde me consulto com médico infectologista me informa que o medicamento está em falta e não há previsão para chegada antes da segunda quinzena de fevereiro. Pois bem, hoje já é 18 de fevereiro e nada!!!!

Vocês devem estar se perguntando como posso ter ficado sem um medicamento que mantém vivo desde dezembro do ano passado. E já que estamos falando de descaso no país da corrupção vai aí outra notícia:
Os medicamentos do coquetel anti-HIV não são vendidos em farmácias ou em laboratórios no Brasil, eles são somente para distribuição gratuita pela rede pública. Acontece que há cerca de 1 ano e pouco outro medicamento que tomo, o Kaletra, também estava em falta e um paciente no Hospital Heliópolis (destes conhecidos de fila que fazemos em consultórios médicos) me forneceu um telefone de uma "enfermeira" que tinha acesso aos medicamentos e poderia me arrumar o medicamento em falta por uma pequena colaboração que à época me custou cerca de R$ 300. Não sei como se fez o esquema, mas ela me disse que não poderia me trazer somente o medicamento que estava em falta, que precisava do nome de todos os medicamentos que eu tomava e me traria os 3 de uma vez. Graças a esta "senhora" que me entregou os medicamentos em uma estação do metrô eu fiquei com a dose correta do Kaletra até que a distribuição fosse devidamente normalizada na rede pública.
Isso aconteceu comigo porque tive a sorte de ter o dinheiro na hora e poder "pagar" pela medicação que na rede pública havia desaparecido.
Com certeza essas pessoas não compraram o medicamento do laboratório, uma vez que a comercialização é proibida em território nacional. Mas devido às falhas na distribuição algum lugar bem sabido por ela tinha o medicamento. Algum médico aviou uma receita com os medicamentos que tomo e ele foi retirado em algum lugar. Isso não é uma vergonha? Tenho certeza que Boris Kasoy há de concordar comigo.

Errei em não denunciá-la? Acredito que não, uma vez que utilizei o serviço no intuito de me manter vivo e sadio. Há erro na ação desta pessoa? É claro que há, no país da corrupção esta e outras falcatruas deveriam ser inexistentes, mas o tal mercado paralelo não deixará de existir enquanto o descaso das autoridades continuar com a saúde pública.

Eu tive a sorte de ter encontrado esta pessoa que me forneceu o tal telefone (já o joguei fora e sequer me lembro do nome da tal enfermeira) através do qual consegui o medicamento na época. Graças a isso fiquei com doses extras do medicamento desaparecido das prateleiras do Centro de Referência desde dezembro de 2009. Mas e daí? O medicamento está acabando, tenho mais 10 doses...e depois, o que faço? O que é que os Josés, as Marias e os Joãos desse país farão sem o Abacavir? Sem o Kaletra e sem mais sei lá o quê?

Há alguns meses vi na TV que a farmácia de um hospital referência em tratamento de Aids havia sido assaltada. Imediatamente me lembrei da tal enfermeira. Ela é culpada? Com certeza é, mas tenho a dizer que este mercado paralelo só existirá enquanto o descaso conosco prosseguir nas farmácias públicas de nosso país.

Eu farei o que de legal houver a meu alcance para obter o Abacavir do Estado. Acho que é possível mover uma ação no Juizado de Pequenas Causas para a obtenção do remédio, vou me informar a respeito.

O Abacavir, pelo que sei, é uma medicação que a maioria das pessoas que o toma o faz porque apresentou falhas na terapia anteriormente, ou seja, quem toma Abacavir só o toma porque já é resistente a outras medicações anteriormente tomadas. Ao menos é o meu caso, em 2003 ou 2004 minha carga viral começou a subir e meu CD4 começou a baixar: os medicamentos que tomava não estavam mais fazendo efeito.
Fiz um exame chamado genotipagem que comprovou que eu era resistente a todas as medicações existentes no mercado. Minha morte era certa em pouco tempo porque eu não tinha mais o que tomar.

Quis Deus, assim permitiu Ele, que eu ficasse alguns meses sem tomar nada e na realização do exame de genotipagem feito após as "férias" uma nova terapia fosse introduzida com o coquetel que tomo atualmente. Eu já vi outras pessoas morrerem por falta de medicação que fizesse efeito, mais uma vez tive sorte e isto não aconteceu comigo. Mas será que outros tiveram a mesma sorte que eu ou terão ao terem o Abacavir retirado de suas terapias? Só Deus é quem sabe.

A funcionária da farmácia em sua santa ignorância me disse hoje calmamente que a minha médica estava substituindo o Abacavir pela Estavudina. Eu já tomei Estavudina durante anos (sou soropositivo desde 1987) e minha carga viral só subia depois de pouco mais de um ano com aquela terapia. E ela ainda me deu de presente uma sensação de dormência no pé direito chamada de neurite periférica, muito comum quando da ingestão desse medicamento por algumas pessoas.

Bem, é isso, vamos ver que fim isso tudo vai ter. É bom o meu relato para as pessoas que acham que hoje em dia não devem se preocupar em fazer sexo seguro porque a Aids é perfeitamente tratável e alguns comprimidinhos diários podem resolver o problema. Se elas soubessem...

Se algum leitor tiver o Abacavir em seu armário porque mudou de medicação e não o devolveu ao Posto de Saúde, por favor entre em contato comigo, ok?

E pensando nisso me veio uma idéia. Vou abrir um blog

que pode ser acessado pelas pessoas que têm medicamentos que não utilizam mais e que podem ser utilizados por quem os necessita, não é uma boa idéia. Mãos à obra!!!

Abraços a todos!

Anderson

PS: se você não tem o Abacavir e tem dinheiro para comprá-lo, encontrei esta farmácia no exterior que vende cada comprimido por US$ 13,04 (R$ 23,77), ou seja, a dose para um mês sai pela bagatela de R$ 1426,20 no câmbio de hoje. E vamos pagando impostos!!!

http://pharmacy-bestsellers.net/comprar-ziagen-brazil.html

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

E-mail de uma leitora de 09/02/2010


E-mail de Lúcia


Oi Anderson, Fico aliviada com noticias suas...que bom que deu tudo certo em suas viagens...continue postando em seu blog, que estarei sempre dando uma passadinha por lá..vc foi a primeira pessoa em que eu li falando sobre o HIV positivo...sei que vou aprender muito com sua experiência de vida pós HIV...faz 4 dias que descobri que contrai o virus depois dos exames de pré natal, estou grávida de 17 semanas e em choque ainda...confusa e com muito medo...fiquei um pouco aliviada depois que li o seu blog...meu marido fez o exame ontem e também está apreensivo...hoje é meu aniversário e pela primeira vez não achei motivo para comemorá-lo...amanhã irei ao laboratório para marcar ou fazer o exame cd4...não sei direito o que é...mas sei que vou conviver com isso pra sempre...obrigado por me mandar o e-mail e tudo de bom pra vc que passou a ser meu referencial de como se viver uma nova vida!!! bjus e até mais.
Querida Lúcia, em primeiro lugar quero lhe desejar, mesmo que atrasado, um Feliz Aniversário. Celebrarmos o fato de estarmos vivos é sempre bom em nossas vidas quaisquer que sejam as circunstâncias, minha amiga.



Pode lhe parecer que eu, Anderson, vivo a jogar o jogo do contente na vida e talvez isto até desmereça um pouco minha pessoa no sentido que pra meus leitores eu sou um cara de sorte.


Eu não gosto de falar sobre religião porque este assunto é bastante delicado. Independente de qualquer coisa o que eu posso lhe dizer, Lúcia, é que entre imediatamente em contato com essa energia de vida que você tem aí dentro de você. É ela que vai mantê-la viva e lhe dar forças pra superar os momentos difíceis que podem estar por vir, e também os maravilhosos momentos que certamente também estão por vir. Porque a vida é assim, Lúcia, a minha, a sua, a dos outros, a vida é cheia de bons e maus momentos.


Eu não sei quantos anos tem e nem sei se já leu meu livro, mas queria lhe dizer que aos 20 anos de idade recém feitos, portanto há exatos 22 anos indo para 23 em 13 de março próximo, um médico me disse que eu não deveria ter mais do que 2 anos de vida à frente. E aqui estou eu pra lhe escrever e tentar de alguma forma amenizar sua dor e apreensão.


Sempre quis ter um filho, mas como nasci homossexual e descobri ser HIV muito cedo, decidi por não tê-lo. Se tivesse tido um fiho (adotado) naquela época, ele já seria um homem feito. O tempo passa tão rápido, né?
Eu na minha vida, Lúcia, sempre lido com ambas as probabilidades de acontecimento ao encarar um problema. Se eu fosse você eu provavelmente lidaria com o fato de estar grávida e ter descoberto ser HIV+ da seguinte forma:


1) Se meu marido for HIV+ como eu nos apoiaremos mutuamente nessa jornada. Caso ele não seja, ficarei muito feliz por ele e o mínimo que eu espero dele é que me apóie. Caso ele não me apóie quem vai perder será ele, e não eu. Não vou dar lugar em minha mente à questão da culpa porque isso é ruim pra mim e agora eu só quero o que é bom pra mim. Preciso cuidar de minha saúde muito mais agora porque vem aí uma vida que vai precisar de mim e tenho fé que ela será muito bem-vinda e virá com saúde.


2) Estamos em 2010, tenho muito mais sorte do que o Anderson porque ele descobriu que era HIV+ quando sequer remédios existiam, e o número de drogas disponíveis hoje é imenso e tenho certeza que eu me enquadrarei muito bem dentro de um tipo de tratamento disponível.




3) Não vou entrar em pânico porque não há razão pra isso. Não sou a primeira e infelizmente não serei a última mulher a descobrir a sorologia em um exame pré-natal. Hoje em dia a porcentagem de chance de um bebê nascer com o vírus se a mãe fizer o pré-natal direitinho é muito baixa. Vou pesquisar sobre o assunto e falar com meu médico a respeito.




Se a criança nascer soronegativa ficarem imensamente grata, mas se o contrário acontecer não me desesperarei porque sei que o número de adultos nos dias de hoje que já nasceram com o vírus é bastante grande e não será diferente com meu bebê.


Uma coisa que eu queria lhe dizer sobre médicos. Não se contente com pouco, Lucia. Se não gostar do médico, troque, troque e troque até se acertar com um. Não digo agora, porque você precisa ser assistida durante o pré-natal, mas depois que o bebê nascer não se deixe levar pelo conformismo do “é ruim, mas é de graça”, ok? Lhe digo isso por experiência própria...rs...

Bem, minha querida, por enquanto é só. Espero que de alguma forma tenha lhe ajudado. Estarei sempre aqui pra trocarmos idéias, ok? Infelizmente já é tarde e tenho que ir dormir porque amanhã trabalho até tarde da noite e tenho faculdade pela manhã. Sim, eu, Anderson, HIV+ desde os 20 comecei a fazer faculdade aos 42 beirando os 43. Acho que dá pra você ver que não vejo o vírus como uma sentença de morte, não é, Lúcia?

Desde já lhe agradeço pelo contato e queria lhe parabenizar por ser a primeira a ter seu e-mail e resposta publicados no blog. Desde o ano passado eu já pensava em publicar os e-mails que recebo, mas adiei até hoje não sei por quê. Recebo uma média de 2 a 3 mensagens por mês já há anos e sempre acabo escrevendo respostas longuíssimas...rs...não consigo evitar de escrever muito. De agora em diante vou começar a dividir aqui neste espaço os problemas das pessoas que me escrevem com o intuito de ajudá-las e também ajudar pessoas que possam estar passando pelo mesmo tipo de problema.
No fundo, no fundo, sem querer simplificar demais, nossos problemas como soropositivos são muito similares e às vezes uma resposta pode acabar ajudando outra dezena de pessoas sem que elas necessitem me escrever, entende?

A propósito, não vou divulgar seu e-mail nem tampouco seu nome. Trocarei seu nome na mensagem divulgada no blog, ok?
Se quiser pode assinar o blog como seguidor e não ter seu nome divulgado, ok? A vantagem é que como eu escrevo pouco no blog por falta de tempo as pessoas não têm que checar se há post novo e perderem tempo com isso. O blog avisa quando há post novo.

Um beijo grande pra você. Quando quiser me escrever mais fique à vontade. Não costumo responder de imediato mas uma coisa é certa: sempre respondo, ok?

Beijo grande pra você e pra esse anjinho que começa a se preparar aí dentro de sua barriga. Anjinho nenhum gosta de perceber a mãe triste, viu? Trate de se animar e comemorar seu aniversário hoje mesmo porque você tem sim, muitos motivos pra comemorar a vida
. Basta olhar ao seu redor. Fica com Deus.

Anderson Ferreira

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Cheguei de Dubai!!!






































Tenho recebido e-mails de leitores preocupados com o desenrolar da história de Dubai me perguntando se eu voltei, se correu tudo bem por lá, etc. Pois bem, fui à Dubai em Janeiro de 2009, saí para o Egito, retornei do Egito e saí para o Brasil. Depois, em janeiro de 2010 fui ao Egito novamente via Dubai e fiz tudo novamente são e salvo!!!

O segredo é, meu amigos soropositivos que vão a Dubai. Viajando de Emirates há probabilidades, e grandes, dependendo do seu tipo físico (se for moreno e se parecer árabé as chances são grandes) de que suas malas sejam revistadas na entrada do país e até mesmo na saída. Nas 8 vezes em que entrei e saí de Dubai só pediram para revistar minha mala uma vez, mas meu companheiro de viagem teve a mala revistada umas tantas vezes simplesmente porque não tem a pele branca e olhos azuis como eu. Sim, essa é a verdade, na cabeça deles só porque eu me pareço europeu não represento grande perigo à segurança nacional...rs...não sei por quê, uma vez que poderia muito bem por dinheiro, sei lá, ou por outro motivo qualquer, trabalhar para membros terroristas....rs...o que não é o caso, é claro...rs...

Continuando, se você viaja de Emirates (a linha aérea dos Emirados Árabes) terá que obrigatoriamente passar por lá, mas a vantagem é que mesmo que fique um dia por lá você só precisa desembarcar com sua bagagem de mão. Minhas malas seguiram direto para o Egito, e na volta, seguiram direto para o Brasil, não passaram por revista nos EAU (Emirados Árabes Unidos).

Bem, é isto, fui e voltei são e salvo, graças a Alá! É claro que tive que ficar dois dias sem tomar meus anti-retrovirais que estavam na bagagem despachada no Brasil, mas isso não é assim tão preocupante quando se está em bom estado de saúde. E também, se não estivesse, não teria feito uma viagem dessas, não é mesmo?
Fica aí a dica. Se você viajar de Emirates pra qualquer parte do mundo, na hora de fazer a reserva online dê espaços entre os vôos e a companhia lhe oferecerá estadia em Dubai. Use suas horas na cidade para conhecer, vale a pena.

Ano passado na ida chegamos à noite e embarcamos no dia seguinte à tarde. Assim que chegamos ao hotel pegamos um táxi e fomos conhecer a cidade. Este ano fui mais esperto e chegamos também à tarde na volta para o Brasil, o que nos deu ainda mais tempo pra passear.

Eu não iria à Dubai pra ficar uma semana em minha condição. Não arriscaria ficar tanto tempo sem tomar os medicamentos, mas sinceramente, uma tarde e uma manhã é suficiente pra se conhecer as partes mais interessantes da cidade. Este ano fomos até ao Dubai Mall e ao Mall of the Emirates fazer compras.

A moeda de lá é o dirham, 1 real compra aproximadamente 2 dirhams na data de hoje. Os preços são convidativos pra se comprar eletrônicos e roupas, claro, não nas lojas de grife, o que pra mim não fez mal algum....rs....comprei coisas legais e não gastei muito dinheiro, até porque não sou nem de longe rico, vivo de salário mesmo.

Bem, queria desejar a todos os leitores um Feliz 2010 (embora já estejamos em fevereiro o ano por aqui só começa depois do carnaval...rs...). Está tudo bem comigo, ando um pouco preocupado com os medicamentos aqui no Brasil. Um dos que eu tomo se chama ABACAVIR e está em falta desde dezembro. Por sorte, tinha extra em meu estoque porque comprei de atravessador, mas isto é assunto pra outro post.

Comecei a fazer faculdade de Letras aos 42 anos beirando os 43 (faço aniversário em 24 de fevereiro) e estou muito feliz com minha escolha. Continuo trabalhando muito, estudando muito e vivendo muito!

Beijo grande a todos vocês e até o próximo post!

Anderson Ferreira







quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Publicando e-mails de leitores

Estive aqui pensando com os meus botões: volta e meia recebo um ou outro e-mail neste e no outro blog que tenho e respondo às perguntas das pessoas com relação a maneira como me sinto, sobre meu estado de saúde, minhas experiências, etc...ou simplesmente respondo a elogios e/ou críticas destinados ao livro que escrevi e disponibilizo a todos através desta maravilhosa ferramenta chamada internet.
Foi aí que pensei que de agora em diante vou postar estas mensagens aqui no blog para que outros tenham acesso a elas. Desnecessário dizer que não vou publicar o nome verdadeiro daqueles que me escrevem, vou publicar as mensagens porque às vezes aquilo que escrevo àquela pessoa pode ser, talvez, de serventia a outros, não é mesmo?
Beijos àqueles que são de beijo e abraços àqueles que são de abraço.
Anderson

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Uma dica aos soropositivos que pretendem passar por Dubai

Pois bem...a novela continua e achei correto vir aqui dar um update nas notícias.
O dólar subiu loucamente! Quando comprei minha passagem para o Egito via Dubai em maio de 2008 o preço estava bom, mas nada de muito especial. Fazendo a conversão para reais a passagem saiu por nada menos do que R$ 2.700,00...preço bom na época, hoje, considerado uma pechincha! Graças à alta do dólar a mesma passagem saíria hoje por aproximadamente R$ 4.200,00!!!
Eu liguei para a empresa aérea e expliquei que sou soropositivo e que havia tomado conhecimento através de artigos na internet que a presença de soropositivos no país não é grata.
O funcionário ficou meio sem jeito e me disse que não sabia como lidar com a questão pois nunca havia tomado conhecimento de situação parecida. Ele pediu meu telefone e me disse que me ligaria no dia seguinte. E assim o fez: no dia seguinte ele me ligou e disse que havia verificado com seus superiores e realmente não era permitido a entrada no país de soropositivos, mas adicionou que ele mesmo já havia ido à Dubai algumas vezes e nunca o haviam perguntado se era ou não era portador do vírus HIV.
Eu concordei com ele, mas expliquei que meu caso era simplesmente a probabilidade de abrirem minha bagagem e me prenderem por ser portador de uma doença que "pelas leis deles" não é permitida no país.
Eu jamais diria a ninguém que sou HIV+, mas ao abrirem minha bagagem veriam minhas medicações e aí então eu seria incriminado pelas evidências em minhas malas!
Ele concordou comigo e disse que estava instruído a ressarcir o valor que eu havia pago pelas passagens sem a cobrança de multa. Como é boazinha a empresa aérea - pensei - não, não pensei nada disso! Pensei sim que de nada adiantaria, pois com a alta do dólar eu teria que pagar no mínimo R$ 1500 por uma nova passagem via Europa...isso se eu conseguisse passagem na data necessária para se encaixar com o pacote que eu previamente obtive no Egito.
E agora? - perguntei a ele. E ele me respondeu: "Senhor...infelizmente tudo que podemos fazer é ressarcir o valor da passagem, não podemos ser responsabilizados pela crise câmbial mundial.
Foi aí que ele me disse que antes de tomar qualquer atitude eu deveria telefonar para a Embaixada de Dubai na cidade de Brasília.
Saquei o telefone e em minutos falava com uma funcionária com sotaque árabe carregado. Contei minha história a ela e tudo o que ela me disse foi que uma vez que os medicamentos que eu tomo não fazem parte das drogas banidas pelas leis dos Emirados Árabes, o que eu deveria fazer era solicitar ao meu médico uma receita escrita em língua inglesa ou em árabe e colocar os medicamentos em minha bagagem despachada, não na bagagem de mão.
Ela me disse que provavelmente como eu vou ser passageiro em trânsito (chego em Dubai Às 21 horas de um dia e pego o vôo para o Egito no dia seguinte às 15 horas) eu não teria que fazer check-out em minha chegada ou check-in para embarcar para o Egito, resumindo, minha bagagem não vai ficar indo pra hotel, voltando de hotel, etc...provavelmente eu embarcaria minha bagagem no Brasil e só a veria novamente quando da minha chegada no Egito.
Fiquei mais aliviado com o que ela havia me dito. Ela deu a entender que mesmo que minha bagagem fosse esmiuçada pela imigração de Dubai, eles veriam os medicamentos, checariam a lista de drogas não permitidas no país, checariam a receita e me permitiriam passar as horas necessárias em seu país aliviados por saberem que eu, um vírus ambulante e perigoso, estaria de saída dentro de algumas horas.
Aí eu liguei para a empresa aérea novamente, falei novamente com aquele funcionário e ele confirmou que minha bagagem despachada não seria liberada em minha chegada, disse que eu só ficaria em poder de minha bagagem de mão nas pouco mais de 18 horas de estadia naquele simpático país.
Bem...eu não entendi nada...porque já havia dito ao funcionário que minha preocupação era pura e simplesmente por causa dos meus remédios!
De qualquer forma estou mais esperançoso com isso tudo. Acredito mesmo que tudo dará certo, afinal de contas tudo sempre dá certo em minha vida...rs...e se não der, se não der, se não der...bem...ao menos eu tentei...e como!
A minha dica, fazendo jus ao título deste post, é: se você é soropositivo e quer ir a Dubai, coloque seus medicamentos nas malas despachadas em um saco plástico devidamente acondicionados e acompanhados da receita médica redigida em língua inglesa ou em árabe.
Lembre-se que esta dica só vale para passageiros em trânsito, e nem sei se minha história vai dar certo ou não. Isso vocês só vão descobrir nos meus posts pós-viagem em 2009.
Eu ia ficar em Dubai por uma semana antes de embarcar para o Egito, mas tive um daqueles insights e cancelei tudo ao ver as notícias cujos links se encontram em posts anteriores aqui no blog. E nem preciso dizer que estou muito feliz com minha decisão, né?
Se você é soropositivo e vai à Dubai para ficar lá por aquelas terras carregando seus medicamentos, por favor me contacte e me diga como foi sua experiência.
Eu vou ficar sem tomar meus remédios por quase um dia na ida e mais um dia na volta, mas sinceramente digo aqui do fundo do meu coração: se depender de mim Dubai não verá meu passaporte tão cedo novamente nesta existência.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Eu tenho o direito de ter AIDS?

Eu sei que o título deste post é um tanto quanto agressivo, mas no momento é assim que eu me sinto! Tendo adquirido consciência de minha condição de soropositivo há 21 anos às vezes ainda me assusto ao perceber que a ignorância alheia ainda existe em relação a minha condição.
Sei que não sou o único nesta condição, mas quando se trata de lidar com preconceitos cada um tem sua maneira de reagir. A minha reação sempre foi de espanto, de espanto e um terrível dó daqueles que dividem espaço comigo neste planeta.
Já há algumas semanas vivo um terrível dilema pessoal. Meu namorado sempre teve verdadeira adoração pela cultura árabe e principalmente pela História do Egito. Sempre foi seu sonho conhecer o Egito, chegou até a estudar árabe em sua adolescência na ânsia de um dia conhecer as terras egípcias e suas belezas arquitetônicas datadas já de alguns séculos de existência.
Ele também é soropositivo como eu há muitos anos. Estamos ambos bem de saúde, ambos temos carga viral indetectável e contagem de linfócitos acima de 700 cópias.
O risco que temos de virmos a nos despedir em breve desta vida se dá mais em razão de morarmos em uma cidade onde as mortes por causas violentas só fazem aumentar dia após dia do que em razão do vírus HIV que carregamos em nosso sangue. Vivemos em São Paulo, e este já é um bom motivo para nos preocuparmos diariamente se retornaremos vivos a nossos lares depois de um longo dia de trabalho.
Bem, retornando ao assunto: há alguns meses, ele me disse que completaria 40 anos e se daria de presente a tão sonhada viagem ao Egito. Disse-me que a viagem lhe traria muita felicidade, principalmente se eu pudesse ir com ele.
Bem, eu nunca pensei em toda minha vida em conhecer o Egito, mas eu sabia que o faria feliz se fosse junto e imediamente comecei a fazer os preparativos para a viagem a ser feita em janeiro de 2009: roteiros, cruzeiro pelo Nilo, reserva de hotéis, passagem aérea, etc.
Foi então que tivemos a idéia de utilizar uma companhia aérea árabe que voa para o Egito com escala em Dubai nos Emirados Árabes. E foi bem aí nesse estágio que meus problemas começaram.
Compramos a passagem primeiramente e só depois comecei a pesquisar sobre os lugares onde iríamos. Fiquei estarrecido ao descobrir através de minhas pesquisas na Internet a quantidade de preconceito que existe nos países árabes contra portadores do HIV. A quantidade de notícias sobre pessoas que sofrem por serem soropositivas ou apenas suspeitas de o serem em países islâmicos é estarrecedora. Nem vou citar todas aqui porque ficaria tudo longo demais, mas há algumas interessantes:
No Egito homens são forçados a fazerem exame de sangue e até mesmo terem o reto examinado para que ficasse provado que haviam praticado o sexo pecaminoso dos homossexuais

Que tristeza...nem vou colocar outros links porque é tudo muito triste. Todo estrangeiro nos Emirados Árabes que seja portador do vírus HIV é passível de prisão e deportação. Pelas notícias que li a deportação seria o melhor de todos, não gosto nem de pensar o que aconteceria comigo se fosse preso por ser HIV+ nos Emirados Árabes. Pelo que li os Direitos Humanos não fazem parte dos sistemas prisionais de lá. Ser preso sem direito à defesa não me pareceu ser algo incomum por aquelas bandas.
Mas o que me deixou mais triste ainda foi ler em um
grupo de discussão do UOL VIAGEM um artigo que diz que os Estados Unidos vão por fim às restrições de entrada de pessoas portadoras do vírus da AIDS em seu território.
E eu que achava que esse vírus que carrego em meu organismo há 21 anos tinha sotaque americano! Se tinha já deve ter perdido depois de tanto tempo .
O pior foi ler um dos comentários feito por um dos leitores que diz literalmente (COPY AND PASTE DO ARTISTA A SEGUIR): "Sou contra ainda mais sendo estes brasileiros povo extremamente cruel e invejosso serão capazes de conquistar homens e mulheres NORTE AMERICANOS para depois os infectar com HIV EU SE TIVÉSSE A BENÇÃO DFOSSE DE INDOLE DECENTE NÃO BRASILEIRA PARA SER UM AMERICANO ESTADUNIDENSE EU LUTARIA CONTRA SO ABRIA EXEÇÃO PARA OS NATOS DE PAISES DIGNOS COMO CANADA,ESPANHA,ITALIA!!!!!MUITO OBRIGADO".
navblog.uol.com.br/comment.html
O português do cidadão aí acima é sofrível, mas ainda mais são suas idéias. E viva a democracia! Porque graças a ela ambos temos o direito de expressar nossas opiniões!
Bem, pra terminar só posso dizer que estou muito triste com isso tudo. Triste com a mentalidade das pessoas, triste pelo preconceito, triste por saber que em alguns países tanto do mundo dito desenvolvido, leia-se: Estados Unidos da América, quanto do mundo com idéias mais retrógradas como o "mundo árabe", temos ainda que lidar com este tipo de preconceito em pleno final de primeira década do século XXI.
Eu sei que nos Estados Unidos bem como em vários países islâmicos há pessoas que não refletem este tipo de idéia. Estou me referindo aos governos. Até mesmo porque o Brasil é tido como um país de idéias modernas e de um povo mente aberta e o depoimento de meu conterrâneo acima também é a meu ver "um tanto quanto" preconceituoso, pra não dizer outra coisa.
Há 10 anos (comecei a tomar o coquetel em 1998) necessito de medicação anti-retroviral para que meu organismo resista aos ataques do virus HIV. Pretendo ficar 21 dias viajando pelo Egito e não posso abrir mão da medicação por período tão extenso.
O número de
substâncias consideradas proibidas nos Emirados Árabes é imenso (são 27 páginas, clique no link). Se alguém desavisado entra no país portando um medicamento qualquer que esteja na lista de medicações proibidas sem portar receita médica e declaração médica explicando a extrema necessidade do uso daquela medicação, as chances de ser preso não são nada pequenas. Se o risco fosse apenas o confisco da medicação e a permissão de entrada ou até mesmo a deportação do turista isto não seria tão grave, mas pelas noticías que tenho lido na internet as coisas não são assim tão simples.
O grande problema para mim é que minhas medicações não fazem parte da lista negra dos EAU (Emirados Árabes Unidos), mas têm a palavra AIDS estampada em seus rótulos e é condição que todos os medicamentos estejam devidamente acomodados em suas embalagens originais para não criar suspeitas. Ou seja, se correr o bicho pega (por não apresentar as medicações em suas embalagens originais) e se ficar o bicho come (porque ser soropositivo por lá é passível de deportação) .
Pode ser que esses meus medos sejam completamente infundados e eu entre e saia de Dubai sem sofrer nenhum tipo de constrangimento por carregar em minha bagagem de mão comprimidos que me mantêm vivo. Mas pode ser que não, portanto se não houver mais posts neste blog após janeiro de 2009 por favor procurem por mim.
PS: As partes grifadas ou em caracteres diferenciados neste texto são links. Clique nelas para ser levado (a) aos sites correspondentes.





quinta-feira, 13 de março de 2008

Mais um ano se inicia hoje para mim!!!

Mesmo com a correria toda do trabalho eu não podia deixar de escrever um bocadinho aqui. Hoje é 13 de março de 2008. Pra mim um novo ano se inicia. Não se trata de Ano Novo chinês, trata-se de meu próprio aniversário de sobrevivência e nada melhor do que fogos de artifício para comemorá-los.
Em 13 de março de 1987 recebi aquele exame nas mãos me dando a tal sentença de morte que o médico do laboratório proferiu. Sentença de vida foi o que ele me deu sem saber, seu eu mesmo saber.
Foi naquele momento que percebi que se quisesse continuar teria que lutar, que sem luta nada se consegue nesta vida que vivemos. Já são 21 anos convivendo com esse vírus, aproximadamente 7665 dias, um pouco mais contando-se os anos bissextos. Aprendi muito nesses anos todos, cresci muito nesses anos todos, amadureci, envelheci mesmo. Sim, já não sou mais aquele jovenzinho inseguro que era aos 20 anos de idade quando segurei aquele pedaço de papel em minhas mãos.
A beleza física que chamava a atenção já não está mais comigo, a pele não é a mais a mesma...e os cabelos...bem...destes melhor nem comentar, pois não sobraram muitos. Modificada foi a textura capilar, bem como a textura de minh'alma...já não sou mais ingênuo como era, já não acredito mais que meus olhos azuis farão com que as pessoas se apaixonem por mim de forma incondicional, enfim, muitas coisas se foram, mas muitas coisas adquiri.
Adquiri experiência, e isto não tem preço. Aliás, não passa de um clichê dizer que experiência nessa vida é o que vale. Experiência é o que vale uma ova! Perder a viçosidade da pele, adquirir pneuzinhos chatos que insistem em aparecer toda vez que nos olhamos no espelho, isso tudo é um saco, mas é inevitável. Assim como inevitavelmente muitas coisas ruins são trazidas pelo vírus HIV em nosso organismo. Para uns mais, para outros menos, mas todos que convivem com este vírus bem sabem que fácil essa jornada não é.
Mais fogos porque estou feliz! Porque estou feliz e porque mereço!
Mas não se enganem aqueles que fazem de mim um herói imortal inserido em quatrocentas e poucas páginas de narrativa de uma vida que mal poderia ser narrada em poucos milhares de páginas, ou milhões, quem sabe? Se querem saber se estou feliz por completar mais esse aniversário de vida pós resultado HIV, a resposta é: sim, estou.
Mas como infelizmente não sou personagem de um livro criado pela imaginação de um autor talentoso qualquer só posso dizer que continuo minha luta, com alegrias e tristezas diárias, com sonhos, desilusões, muitas tristezas.
Só posso dizer que esta história de que portador do vírus HIV tem que ter qualidade de vida é pura balela. Tem sim que se ter qualidade de vida. Qualquer um que a esse mundo veio, mas é muito difícil.
Eu poderia ter me transformado em um eremita qualquer no intuito de me preservar, mas não o fiz. Porque a espiritualidade me ensinou (não gosto de falar de religião, mas cada um tem a sua, e eu tenho a minha filosofia de vida) que ao se isolar do mundo na ânsia de não pecar e não sucumbir às tentações vantagem alguma leva aquele que o faz.
Então continuo sofrendo como todos. Tenho que atingir metas irracionais no trabalho, respiro o ar poluído de São Paulo, fecho a janela do carro na tentativa absurda de me preservar da violência causada pelas injustiças sociais impostas por esse sistema político corrupto do qual todos nós somos vítima, sofro por amor, ou pela falta dele...sou apenas mais um aqui, como todos os outros também o são.
Mas sonho...visualizo...e como muitos outros...acredito...