quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Fechando 2016




Queridos leitores!
Em um ano em que todo mundo disse que foi um ano horroroso e cheio de dificuldades, me sinto na obrigação de vir aqui e fechá-lo com chave de ouro! Sem querer dar uma de “o sortudo a quem nada atinge” porque sei que estes tipos incomodam, principalmente nas mídias sociais...rs...mas simplesmente querendo passar a todos que dificuldades todos nós temos, não há neste planeta um só ser que seja eternamente feliz, pois a meu ver, não é para isso que estamos aqui. Mas o que realmente quero dizer é que todos nós temos problemas, a única coisa que muda é como cada um de nós vê estes problemas, lida com eles.
E pra começar vou responder a pergunta de um leitor que recebi no final do ano:

Pergunta do leitor Henrique em 09/12/2016: Sem querer ser evasivo, mas o seu ex companheiro, sabia da sua sorologia, acha justo contar?

Resposta: Em 2016 eu tive apenas um relacionamento. Foi um relacionamento com uma pessoa que conheci no sul do Brasil em julho de 2015. Nos vimos, ficamos juntos e nos falamos por algumas vezes via mídias sociais. Depois disso, em janeiro, nos reencontramos novamente em minhas férias e ele me disse que gostava de mim. Em agosto, ou final de julho do ano anterior, não me lembro bem, via whatsapp, eu disse a ele que era soropositivo. A resposta dele foi enigmática, ele escreveu: “tu te tornas responsável por aquilo que cativas”, frase extraída do livro “O pequeno príncipe” que mais tarde ele me deu de presente, mas devido ao rumo que as coisas tomaram, nunca tive coragem ou vontade de ler. Este livro é encantado em minha vida, já tentei lê-lo várias vezes, mas nunca consigo, talvez um dia consiga, sei lá.

Bem, continuando, eu me apaixonei por ele, ele dizia que me amava e estava disposto a mudar sua vida, no sentido de deixar de ser uma pessoa que vivia somente pra si mesmo, que no futuro viveríamos juntos lá no sul, etc, etc, etc...mas ele me traiu, ou melhor, se traiu, porque transou com um cara e esqueceu de apagar as conversas pré e pós-transa do whatsapp e eu tive a “infelicidade” de vê-la. Aí eu o perdoei, mas ele não se perdoou, disse que não me merecia, etc, etc, etc, e não quis me ver nunca mais nesta vida. Ah...me esqueci de dizer...um dia, sem mais nem menos, ele me disse que também era soropositivo e não tocou mais no assunto, ou seja, o recado pra mim foi: você não era tão importante assim pra mim pra eu te contar também só porque você me contou...e a vida seguiu. 

Como morávamos em estados diferentes, nos víamos no máximo uma vez por mês, o máximo que chegamos a ficar realmente juntos foi por 10 dias em minha casa em São Paulo no mês de julho de 2016. As outras vezes foram por poucos dias, em feriados prolongados, tipo Carnaval, ou fins de semana apenas. Nosso “relacionamento”, e coloco entre aspas porque era relacionamento só pra mim. Ele vivia uma vida paralela em Balneário Camboriú transando livremente com outras pessoas e tinha dezenas de “contatos” em seu whatsapp aos quais ele fazia questão de dizer “sou todo seu” e coisas desse estilo dos galinhas virtuais, comumente encontrados no universo da internet hoje em dia. 

Eu mesmo cheguei a dar uma escorregada em nossa “relação” no período em que estávamos juntos. Transei com um cara que eu conhecia há anos e me seduziu com a ideia de que namoro à distância não tava com nada e que eu não deveria perder a oportunidade de estar com ele por mais uma vez...rs....me arrependo? Nenhum pouco, porque estava sendo corneado à distância enquanto trabalhava em minha casa nos fins de semana. O que terminou minha relação não foi a “traição” dele, mas a negação do ato, o que pra mim denota falta de caráter, de resto, não o culpo por nada não.

Me endividei muito por causa do “meu amor”, comprei inúmeras passagens de avião para que ele me visse ao menos uma vez por mês, inclusive diárias caríssimas entre Natal e Reveillon em Florianópolis cujas estadias acabei de utilizar sozinho.  Tenho passagem de avião pra pagar até o segundo semestre de 2017, e o que ficou disso tudo?

A primeira lição foi: “namoro” à distância nunca mais!! Até saio com pessoas nas viagens que faço, já que estou solteiro desde então, mas da próxima vez que rolar um sentimento “verdadeiro” com alguém que mora fora de minha cidade ou esteja apenas visitando a minha, cortarei devidamente  a tempo...rs...

A segunda lição: desconfie de pessoas que lhe dizem que quando estão com uma pessoa, estão somente com aquela pessoa. Quem é fiel simplesmente é, não precisa ficar reiterando a ideia de que é fiel, se o faz, é porque não é, está mentindo pra si mesmo e consequentemente pra você.

A terceira: não coloque sua felicidade nas mãos de ninguém nunca em sua vida. Ame e seja amado, se perceber que está em desvantagem, ou seja, se a pessoa é silenciosa, misteriosa, demonstra culpa velada em suas palavras ou comportamentos, pule fora o quanto antes!

A quarta: não se permita ser usado por uma pessoa. Se a pessoa não tem condições financeiras de jantar fora, por exemplo, e lhe diz: “vamos jantar no shopping?”, esta pessoa está usando você porque percebe que você a ama e quer agradá-lo. No meu caso ele disse isso e nunca pôs a mão na carteira. E em uma das conversas dele com “amigos” no whatsapp ele pede ao amigo que apague fotos da rede social porque o marido, eu no caso, é ciumento e ele não pode perder a pensão. Em pensão, leia-se: passagens aéreas, jantares em restaurantes caros, etc...eu infelizmente não percebia nada disso, achava que estava fazendo bem a alguém que eu amava e que não tinha condições de ir àqueles lugares, etc, nunca passou por minha cabeça que ele estivesse me usando, foi isso que me fez sofrer mais, além do fato, claro, de que descobri também que todas as mensagens que ele me passava de manhãzinha cedo, do tipo “bom dia”, aquelas mensagens automáticas bobas que te mandam sem mencionar seu nome no whatsapp, pois é, mandava pra vários outros também ao mesmo tempo. E o tolinho aqui achava que ele me amava e estava me cumprimentando assim que acordava todos os dias.

E a quinta e última lição: Sim, conte à pessoa que você ama sobre sua sorologia, mas somente a quem julga que vai ter um relacionamento sério. Esse povo com quem sai nas baladas, etc, pra esses, não, não diga nada, use camisinha e já está bom demais. Ninguém tem que saber sua sorologia, isso é uma condição sua que só interessa a você e a quem você ama. Não conte “para” o outro, mas “pelo” outro, ou seja, conte pela consideração que você tem pela pessoa em um determinado período da relação, simples assim.

E pra fechar esta história, não seja a vítima das coisas que lhe acontecem. Seja co-autor delas, ou seja, nada do que nos acontece, a meu ver, em minhas crenças, é por acaso. É assim que lido com o HIV em meu organismo desde que o descobri há quase 30 anos. Este ano faz 30 anos em 13/03/2017 que descobri minha sorologia. Se me visse como vítima disso tudo, acredito que não estaria aqui para contar minha história. O mesmo digo em relação às desilusões amorosas, se foi traído, como me aconteceu, é porque você se permitiu isso. A vida nos dá inúmeras dicas do que nos acontece. E eu não fui traído na verdade, revi minha vida e minhas atitudes e percebi que lá no passado nesta mesma vida, agi da mesma forma com outra pessoa.
Em meu livro, dos capítulos 29 (XXIX) ao 32 (XXXII) há uma narrativa que fala sobre uma história muito parecida com a que eu vivi em 2016, com a diferença de que era eu o algoz e o outro, Fernando, foi a vítima. Tudo se inicia na página 84 e termina na página 97, com direito a muitas lágrimas  e um sentimento hoje de arrependimento, mas não posso mudar minhas ações, não posso mudar meu passado, e acredito que o que fiz a Fernando lá em 1986, se me recordo bem da data, foi vivido de forma muito parecida aqui em 2016, 30 anos depois. A diferença é que eu não fui pego, confessei meus erros, mas me separei de alguém que me amava e me perdoava pelos meus erros assim como fez meu namorado comigo em 2016.

Mas eu não aceitei o perdão dele, muito parecido com o que aconteceu agora, resolvi continuar minha vida de descobertas e sexo desvairado que me levaram a adquirir o vírus HIV talvez meses depois, ou talvez eu até já o tivesse e sem saber tivesse transmitido ao Fernando, disso não sei, acho que só saberei disso quando desencarnar e descobrir o que foi feito de Fernando e dos débitos que provavelmente adquiri em relação a ele, sei lá, ou talvez, ele também estivesse resgatando coisas da vida em relação a mim, quem sabe? Isso não importa, o que importa é que como eu disse anteriormente, ninguém é vítima de nada. Fernando não foi vítima de Anderson, que não foi vítima do namorado de 2016. As coisas acontecem como consequência de nossas ações e escolhas, é isso que importa. Não cabe a mim desejar mal ao namorado de 2016 nem odiá-lo pelo sofrimento que nossa situação me trouxe, o que ele fez consta lá na ficha dele e ele vai ter que responder por suas ações, assim como eu terei que responder por minhas ações. E também não cabe a mim carregar culpas comigo, pelo contrário, não sinto culpa de nada do que fiz ou guardo mágoa do que fizeram comigo, perdoar os outros e a si mesmo é ação-chave para uma vida presente feliz, acredito eu.

Tudo que eu fiz de mal aos outros pode ser anulado com meu perdão a mim mesmo e àqueles que me magoaram no passado. As boas ações anulam as más ações, estamos aqui para aprender com nossas próprias ações, é assim que vejo e sinto as coisas...e se estiver errado, vou descobrir depois de desencarnar...tudo a seu tempo. Não estou dizendo que podemos sair por aí magoando as pessoas que tudo ficará bem, não é isso, o que eu quero dizer é que acredito que com a maturidade espiritual, as coisas ruins, os débitos que eu não conseguir sanar aqui nesta existência, serão por mim sanados através de decisões tomadas por mim, já em espírito, como forma de ressarcir a pessoa a quem eu fiz mal. Por exemplo, suponhamos que Fernando não tenha me perdoado pelo mal que eu lhe causei lá em 1986 e no futuro próximo, sim, vou fazer 50 anos em fevereiro próximo; ao desencarnar, eu decida que tenho que de alguma forma reparar o mal que eu lhe fiz, o sofrimento que eu lhe causei, etc. Posso vir na próxima vida como um filho seu, ou um namorado fiel seu, ou uma esposa, sei lá...o que quero dizer com isso tudo é que acredito que não há castigo divino pras coisas más que fazemos às pessoas, mas que nós, dentro do nosso próprio progresso espiritual, escolhemos provas às quais nos submetemos para reparar o que destruímos lá atrás. É nisso que eu acredito, e não quero que ninguém acredite nisso porque eu acredito, só estou dizendo o que eu acredito, somente isso. Pode ser que eu mesmo tenha escolhido passar por todo esse perrengue com o namorado de 2016 como forma de evoluir, vai saber?

O que ficou de bom com as experiências de 2016

Bem, eu fui lá embaixo por causa da desilusão amorosa ocorrida em outubro de 2016. Porém, contudo, todavia, em vez de ficar chorando fui procurar ajuda. E descobri o Ho’oponopono...vou colocar o link do vídeo aqui pra vocês. Ele me ajudou a trabalhar a questão do perdão ao outro e a mim mesmo...fantástico!




Descobri também a “oração conectada de 4 etapas”, uma oração que me ajudou a ficar conectado com os seres de luz espirituais, que sofrem, coitados, com nossa falta de atenção diária. Eles tentam nos ajudar, mas ficamos tão preocupados com nossos 'sofrimentozinhos' e nosso coitadismo que raramente nos conectamos com eles.



Esta oração me fez entrar em contato comigo mesmo e perceber que a chave para muitos dos meus problemas estava em mim mesmo, pois sou eu também Ser Divino, filho de uma Energia Maior cujo nome cada um dá à sua maneira, não importa, nada tem a ver com religião. Graças a esta oração, parei de tomar antidepressivos e disse adeus à depressão...não sinto mais aquela tristeza desnecessária que me visitava diariamente. Hoje, graças a Deus, me sinto bem o suficiente pra não ter mais que tomar aquelas tranqueiras que acabavam com meu fígado. Já me basta ter que tomar 5 comprimidos diários pra driblar o HIV, né? Não estou dizendo com isso que todo mundo deve fazer a oração e jogar seus remédios fora...cada caso é um caso e cada um sabe de si...eu parei e não me arrependo, porque estou me sentindo bem...mas se tivesse parado e voltado a me sentir mal, teria calçado as sandálias da humildade, voltado ao médico, e pedido receitinhas novamente. Espero que não precise mais de antidepressivos tão cedo em minha vida. E sei que tudo depende de mim, nossa felicidade depende de nós, mas temos o hábito de colocar nossa felicidade nas mãos de um amor, ou de um cargo, ou de uma situação financeira, etc, etc, etc. Levei meio século pra perceber isso, mas graças a Deus e a mim mesmo, consegui. ;-)

O que mais? Ah...consegui um belo emprego mesmo depois de ter feito força pra perder o emprego onde estava há 20 anos e onde recebia um ótimo salário. Todo mundo disse que eu era louco por ter pedido pra ser mandado embora em 2014, depois disseram que eu não conseguiria emprego cujo salário fosse tão bom quanto aquele, mas consegui um emprego melhor ainda em 2016. Não estou dizendo com isso que este emprego vai durar pra sempre, nem tampouco o salário que advém dele, mas tenho que elencar aqui essa situação como coisa boa que me aconteceu e sou grato por ela ter acontecido. Trabalho muito, muito mesmo, mal tenho finais de semana durante o semestre letivo, mas gosto muito do que eu faço e é isso que importa.

Bem, levei um pé na bunda de alguém que não era verdadeiro comigo e que não me amava, que consequentemente não me merecia, acho que isso foi algo bom também!

Minha mãe, depois de muito doente no final de 2015, finalmente se recuperou do problema de saúde, ainda está se recuperando, mas já tem 67 anos e não vai mais voltar mesmo a ser uma menininha saudável, tenho consciência disso...o importante é que ela recobrou sua mente saudável, já que a doença a tinha deixado além de fraca fisicamente também confusa mentalmente. Graças a Deus hoje ela está bem vivendo com dignidade ao meu lado, como sempre.

O que mais posso dizer? Bem, continuo escrevendo sempre que posso e volta e meia recebo e-mail de leitores dizendo que estão felizes em suas vidas por uma ou por outra razão após terem lido o Harte ou um post meu aqui no blog...isto também me deixa muito feliz!
Sou seguidor de um canal no Youtube chamado “Luz da Serra”, este canal me ajudou e me ajuda muito a compreender certas coisas que me acontecem. Sempre indico pros amigos, nada tem a ver com religião, mas sim com espiritualidade, eu recomendo.

E pra terminar, vim para o sul, Santa Catarina, dirigindo desde São Paulo. Isto também foi um feito pra mim, já que não dirijo em estradas e minha depressão mal me deixava dirigir em São Paulo. Peguei o carro dia 22 de dezembro e por causa do trânsito intenso na estrada, dirigi por 11 horas até chegar ao destino final, um trajeto que deveria ter durado pouco mais de 8 horas. Agora ainda tem a volta, mas estou tranquilo, sei que vai correr tudo bem. E agora que estou ainda mais espiritualizado do que antes, não acredito mais em tragédias, qualquer coisa que venha a me acontecer, não será para meu mal, mesmo que aos olhos dos homens seja. No final, a gente fica sempre bem, porque somos espíritos eternos e tudo nos serve como aprendizado, até as piores tragédias que todos veem com pesar e ficam semanas, meses às vezes maldizendo o destino, podem ser muito boas para nossa evolução espiritual.

E minha dica pra 2017 é: perdoem, perdoem muito! Perdoem primeiramente a si mesmos. Adquiriu o HIV em 2016? Que bom! Daqui em diante você vai saber que viver com o HIV não é o fim da vida, muito pelo contrário, pode significar o início de uma vida e você pode fazer a diferença como portador desta doença crônica como portadores de tantas outras doenças crônicas fazem todos os dias mundo afora.

Feliz 2017 a todos os responsáveis pelos cerca de 15.000 cliques aqui no blog! Fico muito feliz sempre que recebo e-mail de vocês me contando coisas boas em suas vidas, ou até mesmo coisas que consideramos “ruins”...sou muito grato por ter a oportunidade de ter este canal de contato direto com os leitores do Harte e do blog. Tem gente que nem leu o Harte, mas que vem sempre aqui e sempre me manda e-mail comentando meus posts...muito obrigado a todos e muita paz na Terra em 2017!
Grande abraço,


Anderson – 04 de janeiro de 2017.

sábado, 19 de novembro de 2016

E-mail de um leitor - novembro de 2016

Queridos leitores,
Recebi há pouco um e-mail de um leitor e após respondê-lo, decidi dividi-lo com vocês. Vou chamar o leitor de Henrique aqui e espero que a resposta que enviei a ele seja de alguma valia a outras pessoas também. Peço desculpas caso contenha muitos erros, pois já é tarde e não tive tempo de revisá-lo.
Grande abraço!
Anderson

Olá Anderson! Tudo bem?


Sou jovem e descobri ser soropositivo recentemente. Li o seu livro e sua história é inspiradora. Só não entendi uma parte, quando você relata que teve uma pneumonia e falou que viu a imagem da sua falecida avó (se não me engano), você teve uma experiência de quase morte? Outra questão, que fico extremamente angustiado, porque são muitas incertezas com relação ao futuro, o medo é paralisante. Como você lidou/lida com essas ansiedades? É uma sensação de tenho que fazer tudo depressa ou fim da linha. Dá para levar uma vida normal? Você tem muitos efeitos colaterais da medicação? Meu maior receio são os efeitos colaterais a longo prazo que podem provocar outras doenças no organismo. Por ultimo, sei que você não é médico ou cientista, mas você acredita na cura? Te pergunto isso, porque sei que a intuição pisciana não falha, rsrs. Desculpa a quantidade de perguntas, mas é que preciso tc com alguém que lide com esse vírus a mais tempo. Abraços, Henrique!

Henrique, meu querido! Muito obrigado pelo seu e-mail! Fico muito feliz quando recebo e-mail de leitores! Me dá a certeza que uma das coisas mais acertadas que fiz nestes meus quase 30 anos de soro positividade foi ter escrito o “Harte de vIVer”! Foram quase 3 anos de trabalho que realmente valeram a pena!
Respondendo à sua primeira pergunta: sim, o que tive em 1996, há exatos 20 anos, foi uma experiência de quase morte, ou melhor, pra mim, uma experiência de intensa vida! (risos)...eu me explico, é porque pra mim a morte não existe, meu querido! A morte é o que vivemos aqui, nosso espírito está encarcerado pela carne do corpo. E quando tem oportunidade, ou seja, quando dormimos, se liberta por instantes e vai realmente viver a vida...no caso da minha narrativa no livro, eu não estava dormindo, estava prestes, ou ao menos naquele momento acreditava, que estava prestes a morrer, e pude viver aquela experiência de forma consciente, coisa rara para muitos, como é pra mim, mas bastante comum para outros que têm a oportunidade de se lembrar diariamente, quando dormem, das viagens espirituais que fazem. São as chamadas viagens astrais conscientes. No meu caso, tive poucas das quais me lembro nesta vida, mas no livro há lá um capítulo que fala de uma experiência que tive quando estava em Londrina em casa de meu amigo Vítor. Para mim, aquilo me serviu, lá atrás, pra me conscientizar que a vida ia muito além daquilo tudo, ou melhor, daquilo tão pouco que a vida se mostrava pra mim. Foi o gatilho pra minha entrada na conscientização da espiritualidade. Foi a forma, à minha forma de crer, que o Plano Espiritual encontrou para me fazer consciente de que esta vida é apenas um minúsculo capítulo no nosso grande livro da vida, a vida verdadeira, a espiritual, esta sim é a verdadeira e infinita. Esta aqui que vivemos neste momento, é apenas um pequeno momento de aula escolhido por nós mesmos, pra exercitarmos nosso aprendizado evolutivo. Estamos aqui para evoluir, e como o planeta que habitamos é ainda na escala evolutiva, um planeta-escola de nível intermediário, aqui sofremos e aprendemos, e aqui também somos felizes e aprendemos. Cabe a nós entendermos as lições como momentos dolorosos nos quais sofremos e somos vítimas, ou como verdadeiras pérolas existenciais com as quais somos presenteados e crescemos através das inúmeras provas pelas quais passamos. Tudo é uma questão de como vemos essas provas. Eu, sempre que posso, procuro entender as provas como gatilhos de evolução. Acabei de passar por um e preciso muito escrever sobre ele, mas não será neste e-mail que lhe escrevo. Ah....e deixo claro aqui que não estou falando de religião, independentemente da religião que cada um tem, seja ele/a muçulmano/a, católico/a, espírita, crente, evangélico/a, etc...etc...etc...as provas são as mesmas, são experiências através das quais nos melhoramos, evoluímos.
E há aqueles que dizem que alguns pioram com determinadas provas, pois se revoltam, passam a usar drogas, se tornam pessoas amargas, isso ou aquilo, mas não é verdade. Porque não há na escala evolutiva coisa tal que se possa chamar de regressão, ou involução, não, meu amigo, não há. Por mais que achemos que alguém se tornou uma pessoa pior por causa de uma prova, nos enganamos, pois a revolta não será eterna, e lá na frente, e quanto a isso cada qual tem o seu tempo, lá na frente, haverá um momento de reflexão, e aquela prova terá cumprido seu intento...que é de nos fazer evoluir, pode acreditar!
Vou escrever mais sobre isto em breve, estou saindo de um momento difícil, de uma prova, mas já estou quase bem, e em breve poderei fazer dela um momento de reflexão e transformar, transmutar, toda a energia que acreditei ser negativa, em algo extremamente positivo, em puro amor, que é o final de todas as coisas nesta vida, e é para isso que aqui estamos, Henrique.
Bem, Henrique, respondendo à sua segunda pergunta, sobre se dá para levar uma vida normal...acho que sou prova viva disso, né? A ansiedade é algo que mina nossos pensamentos e ações, é o mal do século, independente de a pessoa ser soropositiva para o HIV ou soronegativa, isso não importa. O número de pessoas que sofrem de ansiedade hoje em dia é colossal! E não pense você que eu sou um super-herói que não sofre de ansiedade! Bem que eu gostaria, o que eu posso lhe dizer em relação a isso é: você não é o HIV, você não pode deixar que “ele” seja você, ou que seja responsável por sua vida. Ele é algo hoje muito, muito, imensamente menor do que ele era em 1987, acredite! Hoje ele é um vírus que pode ser controlado pelas medicações e principalmente por você, não no sentido que ele tenha perdido sua importância no que tange os cuidados que temos que ter com nossa saúde, etc, mas no sentido que ele é apenas um detalhe na sua vida, como inúmeras mazelas que atingem as pessoas em suas histórias de vida: a leucemia, o diabetes, as bactérias cada vez mais poderosas e resistentes, etc. Eu acabei de sair de uma internação de 6 dias por ter sido atingido pelo vírus rotavirus. Saí do meu trabalho no sábado, 05/11, estava me sentindo a pessoa mais normal do mundo, e quando vi estava internado em um hospital com a vida se esvaindo de mim em águas intestinais e provocando o mal funcionamento dos meus rins, que ficaram sobrecarregados com a desidratação. Pois bem, passei por mais esta, mas ainda estou aqui, 6kg mais magro e ainda um pouco enfraquecido, mas consciente de que a vida continua e que foi só um recadinho que meu corpo me enviou, do tipo: você não é um super-herói, passou por poucas e boas nos últimos dias e gostaríamos de lembrá-lo que caso não se cuide, não se alimente, não se fortifique, os vírus e as bactérias estão de olho em você para trazê-lo de volta à realidade ou levá-lo dela por pura falta de cuidado de sua parte!!!

O que eu quero dizer com isso tudo, Henrique, é que vivemos melhor nossas vidas quando vivemos cada dia como se fosse o último. Não por causa do HIV, mas porque simplesmente é assim que a vida é. Você acha que Domingos Montagner estava preocupado com o HIV quando entrou no rio para nadar? Ou que aquela moça da Vila Mariana cujo ex-marido, ou ex-namorado, sei lá quem era aquele indivíduo, lhe ceifou a vida com um tiro e deixou seu amigo talvez paraplégico; estava preocupada com o HIV? Todos os dias, todos os dias, Henrique, bebês, crianças, jovens, adolescentes, senhores de idade, pessoas em todas as partes do mundo, se despedem desta vida por um motivo ou por outro. O fato de termos HIV não deve ser um problema pra nós, pelo contrário, deve sim ser algo que nos impulsione à frente, sem pressa, no sentido da ansiedade, mas com pressa sim, no sentido de vivermos nossas vidas intensamente.
O que atrapalha a vida do ser humano não é o HIV ou qualquer outra doença, o que nos atrapalha é o medo, meu amigo. Medo de perder o emprego, medo de perder o grande amor de nossas vidas, medo de ser traído, e pra nos livrarmos deste último, muitos de nós trai antes, sem nos apercebermos que estamos traindo a nós mesmos, a ninguém mais.
É o medo que nos torna falíveis, não as dificuldades que vivemos. Eu tenho HIV, o outro tem câncer, aquele outro sofre de transtornos psicóticos, aquela outra sofre de ansiedade e pânico, e mais outros, e mais outros, cada um com seu “fardo”, Henrique. Ah...mas e aquele outro lá que é rico e não tem problemas financeiros, tem um grande amor, é famoso e é feliz? Por que com ele tudo dá certo?
E quem foi que disse que ele está feliz? Talvez ele seja mais infeliz do que eu e você e todos os outros juntos. Como eu disse anteriormente, isso aqui é uma escola, não existe ninguém extremamente feliz cuja vida é um conto de fadas. Isso só existe no facebook e todo mundo sabe que é mentira, não é mesmo?
A chave pra mim é o espiritualismo, não a religião, mas a consciência de que estamos aqui por algum motivo e temos obrigação de fazemos o nosso melhor com HIV ou sem HIV, com desgraça ou sem desgraça. Tudo se resume em uma só palavra: Amor. Estamos aqui para amarmos uns aos outros, cada um sendo útil à sua maneira. Não importa como, não há receita infalível, mas o que não podemos e não devemos fazer, é perder tempo olhando só pra nossos problemas e medos e nos esquecendo que fora da caridade não há salvação. Não temos que descobrir a cura da Aids para sermos úteis, ou inventar o Whatsapp, ou uma startup milionária! Se assim fizermos, parabéns para nós, mas sendo bom profissional, bom filho, bom irmão, bom amante, bom cidadão, bom aluno, bom professor, bom cozinheiro, bom faxineiro, bom cientista, etc, já estamos fazendo nossa parte.
Hoje eu entrei numa loja de doces variados na Vila Mariana e havia lá uma pedinte. Ela tinha uma criança de seus 7, 8 anos consigo. Ela era negra e jovem, talvez fosse usuária de drogas, não sei. A caixa chamou sua atenção e pediu que se retirasse, que ali não era permitido abordar as pessoas. Ela ficou na porta da loja. Em minha sacola havia um pacote de bolachas e uma garrafa de suco. Ela me pediu que lhe pagasse um suco, eu respondi que não tinha dinheiro. Na verdade eu tinha dinheiro, mas não ia me expor ali na frente da loja tirando minha carteira do bolso. Ela não hesitou e respondeu: então me dá este suco que você comprou aí e que está na sua sacola.
Eu me vi prestes a responder: o que lhe faz pensar que eu tenho a obrigação moral de me sentir culpado por poder comprar uma garrafa de suco, menina? – mas eu nada disse, só lancei um olhar de desaprovação a ela, que ela vai entender como descaso, e me retirei daquele local.
O que eu estou tentando ilustrar com esse caso, Henrique, é que a pobreza, a cor da pele, as injustiças sociais, a orfandade, o uso de drogas, portar o HIV, trair, ser traído, enganar, mentir, dizer a verdade, engordar, emagrecer, fumar, beber, ser abstêmio, isso tudo são escolhas que fazemos, escolhas cujas trajetórias nos levarão a algum lugar. Tudo nesta vida é experiência, a forma como as vemos e vivemos, as experiências, fica a cargo de cada um de nós.
Um adolescente de classe média que não consegue fazer uma viagem ao exterior com os amigos do colégio, pode, ser, se sentir, estar, muito mais infeliz do que uma pessoa pobre que vê um chocolate e não pode compra-lo, entende? Pois não são as situações que são terríveis, mas a forma como as vemos. Nós nos vitimamos demais diante das dificuldades, e eu não sou diferente dos outros, só me sinto em vantagem às vezes porque minha ficha costuma cair mais rápido do que da maioria das pessoas que conheço....rs...mas não sei se isso é vantagem ou desvantagem....rs
Eu fui ao fundo do poço porque me apaixonei por alguém que dizia que era o tipo de pessoa que se estava com alguém, estava somente com este alguém. Eu acreditei naquilo, quis acreditar naquilo. Ele me dizia que nos imaginava envelhecendo juntos num futuro próximo, que me amava, me mandava mensagens todos os dias impreterivelmente todos os dias às 6 da manhã, me ligava várias vezes ao dia, eu comprei inúmeras passagens de avião antecipadas que agora são somente faturas de cartão de crédito, enfim, pra resumir, eu parei de comer, parei de produzir, parei de escrever, parei de amar o ser humano e até a mim mesmo por causa disso tudo. Porque quando eu descobri que ele me “traiu”, meu mundo caiu. Ele sumiu, simplesmente disse que não estava pronto pra amar ninguém e não respondeu mais minhas mensagens, não me imaginou mais envelhecendo ao lado dele, não me mandou mais mensagem alguma, não se preocupou mais em saber se eu estava seguro ao dirigir pra casa à noite, sumiu, desapareceu, deve ter até se sentido aliviado por não ter mais que falar comigo.
Enfim, a culpa é dele? Ele é o mau e eu sou o bom? Não, se estou passando por isso, se passei por isso, foi porque por algum motivo isso me serviu como experiência, entende? É claro que como não sou super-herói, aquilo tudo me provocou muita tristeza e sofrimento, mas já estou melhor e hoje posso ver isso tudo como mais uma experiência. Eu não tenho mais raiva dele nem sequer visualizo nesta vida uma relação com ele, mas não sei o que o futuro nos reserva. Talvez eu o reencontre ainda nesta vida e possa um dia conversar sobre tudo que vivemos, talvez ainda venha a viver com ele uma linda e verdadeira história de amor nesta ou em uma vida próxima, ou talvez nunca mais o reveja nem nesta vida nem em outra, mas a experiência que vivi com ele daqui, de mim, nunca mais sairá, isso não há como negar.
Eu vivi uma relação de 15 anos que terminou há pouco mais de 2 anos, achava que nunca mais iria amar ninguém na vida, que isto era algo que não me dizia mais respeito. E olha o que eu vivi? E quem sou eu pra achar que só porque vou fazer 50 anos em fevereiro nunca mais vou amar ninguém? Este é o grande barato da vida, Henrique! A própria vida, suas surpresas, suas provas, suas quedas e levantes, o mais importante não é eu ter o HIV, ou ter sido bonito, ou ter um bom emprego, ou já ter passado fome, o importante é a vida até o dia em que ela durar, meu amigo. E ela nunca acaba, haverá um dia em que ela vai terminar pra mim aqui neste mundo, mas comigo, com meu espírito, ela sempre estará, e é isso que importa para mim, entende?
Respondendo sua última pergunta: sim, eu acredito que a “cura” para o HIV está próxima e acontecerá, mas virão outros vírus e outras doenças, porque é pra isso que estamos aqui, pra sobreviver a todos eles. E de alguma coisa eu vou morrer, até porque não sou mais nenhuma criança. Devo viver mais, 10, 15, 20 anos? Não importa, viverei até quando tiver que viver. Perdi amigos pro HIV quando eles tinham 20 e poucos anos, 30, 40, 50, 60 anos, cada um teve sua história. Não morreram por causa do HIV, morreram porque estava na hora de continuarem suas vidas do outro lado de onde todos viemos. Eu não morri por causa do HIV nestes quase 30 anos mas perdi muita gente por causa dele. Por que não morri? Não sei, acho que um dia vou saber, ou melhor, tenho certeza que um dia vou saber, mas no momento isto não tem a menor importância, porque o HIV faz parte da minha experiência de vida. Não me fez nem melhor nem pior, mas não posso negar que teve e tem grande influencia em minha vida, não fosse por ele não seria o que sou hoje, não teria escrito o “Harte” e não estaria aqui te escrevendo, né? E pra terminar, não sofro de nenhum mal grave por causa dos medicamentos, meu querido, meu corpo está mudando, não por causa dos medicamentos, mas por que vou fazer 50 anos e tudo cai, é a lei da vida, da gravidade....rs...não posso reclamar de nada não.
Bem, preciso terminar porque amanhã cedo vou fazer uma viagem pro interior e quero estar bem pra dirigir...voltei a dirigir esta semana depois de quase duas semanas de cama.
Um grande abraço pra você, Henrique! Espero que meu enorme texto tenha lhe ajudado de alguma forma, ok? Escreva sempre que quiser, é sempre um prazer escrever às pessoas que têm sede de algumas palavras baseadas em minha experiência neste assunto. Não sou o único soropositivo da face da terra, infelizmente, mas tento dar aqui minha pequena contribuição contando um pouco das minhas experiências. 😉
Fica com Deus!
Grande abraço!
Anderson



segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Homem britânico pode ser a primeira pessoa curada do HIV com remédios - fonte: http://gizmodo.uol.com.br/homem-curado-hiv-remedio/

Queridos leitores,
Acabei de ler a notícia abaixo. A matéria está copiada e colada na íntegra pra quem não frequenta o UOL, foi lá que a li. Mas na matéria original os links funcionam, e aqui não, ok? Eu me lembro como se fosse hoje, lá atrás em 1987 quando um anjo que apareceu em minha vida, na época, importava jornais, revistas - internet ainda não existia - no intuito de me animar para uma possível cura. Era tudo em vão mas eu, depois de um ano, já nem ligava pra isso. É engraçado como ainda não ligo pra isso, vivo bem com o HIV. É claro que seria muito legal parar de tomar as medicações, até porque já vou fazer 50 anos daqui a alguns meses e meu fígado não é o mesmo de 1998, quando comecei a tomar as medicações. Naquela época a toxicidade do coquetel era muito maior do que hoje em dia, embora ainda hoje, para alguns, certas combinações ainda promovam intenso desgaste físico em quem as toma. Bem, o importante é que para a nova geração HIV que aí está, há uma luz no fim do túnel. As DSTs continuarão aí para nos alertar sobre a necessidade da camisinha, mas poder parar de tomar a medicação, ah...será muito bom mesmo para todos nós que convivemos com ela!!! Cruzemos os dedos, irmãos! ;-)
Eu pessoalmente sou contra esta sentença de morte que algumas pessoas atribuem a si mesmas pelo fato de serem portadoras do HIV. Morreremos mais dia menos dia e nem sabemos do quê. Esta é a grande verdade! Menos tragédia pessoal seria bom para alguns, e é claro, também, mais conscientização para alguns também seria de bom tom. O que eu quero dizer é que há dois extremos de pessoas portadoras que conheci nestes 30 anos que convivo com este vírus e com pessoas, que como eu, o portam em suas correntes sanguíneas.
Há aqueles que vivem um intenso drama. Algo quase que como um folhetim diário vivido à base de lágrimas e que acham que porque o têm são especiais. São especiais no sentido de não precisarem trabalhar, batalhar pela vida mesmo, como todos nós, ou melhor, como a maioria de nós tem que fazer. Alguns nos param no farol e pedem dinheiro dizendo que têm Aids. Oi??? Eu também tenho! E trabalho para caramba, mermão! É isso que eu respondo. Estas pessoas param tudo em suas vidas em determinados departamentos e se jogam em outros, outros leia-se: drogas, sexo e rock'n roll...hahaha!
Já outras negam-se a acreditar que têm o vírus e continuam a vida, porém, fechados em suas pequenas caixinhas de fantasia-não-tenho-esse-troço...estas também precisam de um empurrão! A negação da situação também em nada ajuda, é necessário que encontremos um equilíbrio diante dessa nossa realidade. E para isso algumas pessoas têm que fazer psicoterapia individual, outras resolvem com grupo de apoio, outras resolvem com a melhor amiga, com marido, namorado, ficante, enfim, a meu ver, é importante que não se guarde este fato para si mesmo.
Bem, mas não foi pra falar sobre isso que vim aqui escrever este pequeno post...risos..era só pra dar a notícia do UOL mesmo. A matéria segue abaixo.
Abraços!
Anderson

Um homem de 44 anos na Inglaterra é possivelmente a primeira pessoa na história a ser curada do HIV com remédios. Cientistas trabalhando em uma nova terapia experimental dizem que o vírus está agora completamente indetectável no sangue dele.
Uma equipe de cinco universidades do Reino Unido está atualmente conduzindo testes em 50 pessoas. Mark Samuels, diretor do laboratório britânico NOCRI, disse ao Sunday Times: “estamos explorando a possibilidade real de cura do HIV. Este é um desafio enorme e ainda é cedo, mas o progresso tem sido notável.”
Atualmente, as terapias antirretrovirais podem ter como alvo as células-T ativas que estão infectadas com o HIV, mas não conseguem tratar as células-T dormentes. Isto significa que os órgãos dos pacientes continuam a reproduzir o vírus.
“Esta terapia é projetada especificamente para limpar o corpo de todo o HIV, incluindo as células dormentes”, disse Sarah Fidler, médica consultora do Imperial College London, ao Sunday Times.
Agindo em duas fases, o novo tratamento consiste em uma vacina para ajudar o corpo reconhecer as células infectadas com o HIV, e uma droga chamada Vorinostat que ativa as células-T dormentes. Este método poderia dar ao sistema imunológico do paciente as ferramentas de que ele tanto necessita.
O paciente não foi identificado; sabemos apenas que se trata de um assistente social em Londres. Ele está cautelosamente entusiasmado com os resultados, dizendo: “seria ótimo se uma cura aconteceu. Meu exame de sangue passado foi há duas semanas, e não há nenhum vírus detectável”.
Fidler diz que os pesquisadores ainda estão muito longe de uma terapia pronta: “continuaremos com os exames médicos pelos próximos cinco anos… no futuro, dependendo dos resultados dos testes, podemos explorar isto”.
Outros procedimentos conseguiram remover o HIV de humanos com sucesso inicial, porém o vírus retornou. Após dois anos, um bebê “curado” voltou a ter níveis detectáveis. Dois pacientes que receberam transplantes de medula óssea não mostraram níveis mensuráveis de vírus por vários meses, mas ele acabou retornando.
Timothy Ray Brown é considerado o primeiro homem curado do HIV, mas recebeu um tratamento difícil de replicar: um transplante de medula óssea com uma mutação genética especial que o torna quase invulnerável ao vírus.

domingo, 21 de junho de 2015

Os gatos não são os principais vilões pela transmissão da toxoplasmose

Olá, queridos amigos e leitores,

Há tempos não escrevo por aqui. Está tudo bem comigo, trabalhando muito. Vivendo uma vida nova, me desliguei de um emprego onde estava há mais de 20 anos e mudei completamente minha vida, pra melhor, graças a Deus. Menos dinheiro, mas mais felicidade! Dinheiro realmente não é tudo na vida. Continuo aqui minha luta diária na vida como todos vocês, matando um leão por dia, né? Vi esta reportagem no UOL sobre o papel do gato doméstico na transmissão da toxoplasmose e achei importante dividir com vocês.

Muitos soropositivos como eu, ainda nos dias de hoje, desenvolvem a toxoplasmose. Doença que afeta o sistema nervoso central. Tive alguns amigos nessa minha trajetória de 28 anos como portador do vírus HIV, que infelizmente vieram a desenvolver a doença. A grande maioria a desenvolveu em uma fase em que ainda não sabiam que eram portadores da doença. Por isto é tão importante que a pessoa saiba que é portador do vírus o quanto antes, para que não dê ao organismo as chances de adquirir tais doenças tão danosas ao corpo e ao cérebro do paciente. Pelo que sei, a doença tende a se manifestar em momentos em que o portador está com sua resistência baixa, leia-se: taxa de linfócitos CD4 baixa (não sei quanto os médicos consideram taxa necessária hoje em dia para início do tratamento com antiretrovirais) e carga viral do vírus HIV alta no sangue. Também é importante dizer que a doença deixa sequelas mas que muitas pessoas que conheço conseguiram uma incrível melhora em seu quadro clínico através de tratamentos como fisioterapia, etc. Cada caso é um caso, né?

Minha recente ignorância quanto a questão da taxa de CD4 mínima aceitável se dá pelo fato de que já há 10 anos minha taxa de CD4 está na casa dos 1000 e a carga viral está também indetectável. Por isso não tenho me inteirado sobre o assunto.

Em março eu tive uma infecção urinária, fui a um hospital particular do  convênio e o médico mal olhou na minha cara. Disse que eu estava com uma infecção urinária e me receitou um antibiótico chamado Ciprofloxacino. Eu disse a ele que sou soropositivo para o HIV e que minha carga viral estava indetectável e o último exame de sangue feito em dezembro acusava contagem de linfócitos CD4 em 980 cópias. Ele me disse que eu não me preocupasse, que infecção urinária é algo comum, que eu tomasse os medicamentos e se não melhorasse em 48 horas, que voltasse ao hospital.
Eu tive um feeling de que ele deveria pedir um exame de sangue ou de urina pra verificar o grau de infecção, mas me calei diante de sua falta de atenção. Pois bem, fui pra casa, a febre baixou com a injeção que me deram e voltei pra cama. Por volta de meia-noite minha febre havia voltado e subira muito rapidamente, perdi a consciência e tive uma convulsão. Fui levado às pressas para o mesmo hospital onde fiquei por 5 dias internado na Unidade de Terapia Intensiva. Pois é, os médicos erram, e eu errei por não ter insistido que ele verificasse o grau de infecção...paguei um preço alto, a infecção já estava indo para a corrente sanguínea e quase que me despeço deste mundo por uma bobagem. Depois de tanta luta, morrer por uma infecção urinária mal tratada, é no mínimo burrice, né? E nada tinha a ver com o fato de eu ser soropositivo, muito pelo contrário, acredito que se meu organismo estivesse realmente debilitado, não teria resistido e a infecção não haveria sucumbido aos antibióticos aplicados na UTI.

Durante minha internação, os médicos da UTI pediram exame de sangue pra verificar minha taxa de CD4 e carga viral e o resultado foi: carga viral detectável com 1300 cópias e taxa de linfócitos Cd4 em 780. Me assustei com a notícia, já que minha carga viral estava indetectável há mais de 10 anos, falei com minha infectologista e ela acha que pode ter havido erro no hospital, fiz novo exame na rede pública há cerca de um mês e aguardo resultado oficial. Se a carga viral voltou a se multiplicar, vamos ter que mudar o coquetel. Já tive que fazer isso algumas vezes nestes 28 anos, quem lê meu blog tem relatos meus de anos anteriores tratando deste assunto.
Bem, vamos esperar e ver o que há por aí. Estou tranquilo, qualquer que seja o resultado, não sou do tipo que sofre por antecipação, se tiver que mudar a medicação, vamos mudar e pronto, o importante é ficar de olho no tratamento pra não dar vazão a infecções oportunistas como a toxoplasmose e outras mais que há por aí.

Há um outro evento que aconteceu comigo recentemente relacionado à Hepatite C mas isto fica pro próximo post, lá pro final de agosto, começo de setembro, volto e conto a história pra vocês.
É isto, queridos leitores, obrigado pelo acompanhamento do blog e pelos emails que sempre recebo de vocês. Gosto muito quando recebo feedback do livro. Fico muito feliz quando fico sabendo das experiências de vocês e do impacto que o "Harte" tem em suas vidas.  Um amigo me disse que deveria traduzi-lo para o inglês, já que sou professor de inglês, mas não me sinto apto a isto, nem em termos de tempo nem em termos de capacidade pra fazer a tradução, não sou bom em tradução...quem sabe um dia? Um tradutor me pediu R$ 20.000,00 para fazê-lo, negócio de amigo pra amigo, mas é uma quantia muito grande pra desembolsar por algo que não vai ser comercializado.

Ele sugeriu que eu entrasse em um destes sites onde fazem vaquinhas virtuais para a elaboração do projeto, vou pesquisar a respeito assim que tiver tempo, quem sabe o Harte sai em inglês, com certeza vai atingir muito mais gente no mundo todo, né?

Grande abraço pra vocês e boas férias de julho pra quem tem férias em julho, o que é o meu caso. ; - )
Segue a matéria abaixo, copiada e colada do site UOL.

Anderson Ferreira

Fama descabida: o gato não é o vilão da toxoplasmose, dizem especialistas


A fama vem de longe. Falou em gato e gravidez, a toxoplasmose sempre termina pautando a conversa.
A psicóloga Juliana Del Vigna, 40, adotou a gata Dadá quando o filho João tinha apenas um ano. Quando foi engravidar do segundo filho, muitas pessoas a questionaram sobre o perigo do animal. Mas ela conta que não teve medo. "Eu não ia me desfazer da minha gata por causa da gravidez, é uma questão de esclarecimento".
"A médica disse que, antes de engravidar, eu teria que fazer uns exames para ver se poderia ficar com meu gato", lembra a  jornalista Raquel Drehmer, 38. Ela também relutou em se desfazer de Fofão e preferiu procurar outra ginecologista. No fim, não precisou abrir mão do bichano, que  logo mais fará companhia para seu bebê, previsto para nascer no começo de julho. 
A toxoplasmose é motivo de preocupação para quem engravida. Principalmente durante o primeiro trimestre da gestação, ela pode causar, por exemplo, retardo mental e cegueira. E, segundo o veterinário-chefe do Vet Quality, Cauê Toscano, o gato é o único hospedeiro que consegue eliminar a forma infectante da doença, pelas fezes. "Mas é uma fama que acabou sendo criada, infelizmente, que não corresponde a realidade."
O gato não é o grande vilão da doença, explica o infectologista Celso Granato, professor da Universidade Federal de São Paulo e assessor médico do laboratório Fleury, porque não é o principal culpado pela disseminação. 
"O ciclo do protozoário toxoplasma gondii tem que passar pelo gato, mas o animal leva uma culpa maior do que merece. O que acontece na prática é que há mais chances de se contrair a doença tomando água contaminada, comendo carne vermelha crua, salada e usando utensílios contaminados", ressalta.
Foto acima: a jornalista Raquel Drehmer, 38, com o marido Augusto e o gato Fofão.
Além disso, diz Toscano, o cisto da toxoplasmose só é liberado durante até três semanas da infecção do gato. "Então teria que coincidir o gato contaminado com a doença no momento da gestação da mulher e, durante estas três semanas, ela ter algum problema de higiene que fizesse com que tivesse contato com o protozoário. Passadas as três semanas, mesmo que o animal esteja infectado, ele não vai liberar o cisto."
O veterinário também explica que o cisto, depois de eliminado, precisa de pelo menos 24 horas para se tornar infectante, então uma pessoa que limpa a caixa de areia do gato todos os dias não permite que o prazo de evolução se complete. 
O infectologista destaca ainda que o número de casos de toxoplasmose caiu expressivamente nos últimos 30 anos, diminuindo o risco de contágio.
"Passamos a comer bem mais carne congelada, e o congelamento mata o cisto do toxoplasma. A água também é muito mais tratada do que antigamente, e, o último fator, é que a maioria dos gatos de estimação dos dias de hoje é alimentada com ração. Se eles não saem para caçar não pegam doença e, consequentemente, não transmitem para as pessoas", explica.
"Os gatos em casa não apresentam perigo, basta tomar cuidado com a higiene e a alimentação", defende Granato, que até pouco tempo tinha dois felinos em casa.
Fonte: https://www.blogger.com/blogger.g?blogID=1556091694501895365#editor/target=post;postID=5941679681507242529 acessado em 21/06/2015.


domingo, 22 de fevereiro de 2015

Cuba descobre variante mais agressiva e preocupante do vírus HIV

Especialistas em saúde de Cuba detectaram há alguns anos algo diferente e pouco comum nos pacientes com o vírus do HIV no país: eles desenvolviam a Aids de uma forma extraordinariamente rápida.

Tão rápido que, em menos de três anos, já se encontravam muito doentes, sem praticamente tempo de perceberem que tinham o HIV.

Um grupo internacional de cientistas chegou para investigar a situação e concluiu que, realmente, em Cuba existe uma variante do HIV que é muito mais agressiva.

"Sabemos que 144 pacientes têm essa linhagem do vírus, mas com certeza há mais gente. Isso é só o que conseguimos contar", disse à BBC Anne Mieke Vandamme, da Universidade Leuven, da Bélgica.

Vandamme, cujo trabalho foi publicado na revista EBioMedicine, explicou que se trata de uma linhagem do vírus que foi originalmente descoberta na África.

"Ela foi parar em Cuba por meio das relações dos cubanos com a África. Ainda que não tenhamos conhecimento de que a linhagem tenha se disseminado pela África, ela tem se disseminado em Cuba", acrescentou.

Mais rápido

Os especialistas explicam que, em uma infecção normal, o vírus do HIV tem de se "agarrar" aos receptores, as proteínas na membrana das células.

Em uma infecção comum, o vírus usa o ponto CXCR5. Depois de muitos anos em pleno estado de saúde, ele se muda para o CXCR4, o que coincide com a aceleração da propagação da Aids.

A equipe de cientistas, liderada por Vandamme, observou que, nos pacientes cubanos, essa transição acontece de forma muito mais rápida.

Isso quer dizer que o vírus não "espera" tanto para se dirigir ao CXCR4. O que elimina, de forma drástica, a fase em que o paciente tem uma vida saudável.

Os cientistas estudaram amostras de sangue de 73 pessoas que haviam sido infectadas recentemente e 52 delas já haviam desenvolvido a Aids.

Vandamme explica que o HIV tem diferentes linhagens que podem ser classificadas como "subtipos"; o detectado em Cuba tem "basicamente HIV recombinado de três outros subtipos".

"Você precisa ter sido infectado por mais de um tipo de linhagem do HIV para ter um vírus recombinado como esse", esclarece.

Anti-retrovirais

A especialista explica que, se o tratamento com anti-retrovirais costuma funcionar bem para tratar infecções normais, ele perde um pouco da eficiência dependendo do nível de avanço da doença – "quanto mais avançada ela se encontra, menos consegue se recuperar do sistema imunológico".

"Inclusive, para alguns pacientes, é tarde demais para ter qualquer benefício dos medicamentos", acrescentou.

A cientista explica que, por enquanto, não há preocupação sobre a possibilidade de esta linhagem do vírus se expandir para além da ilha. Isso porque, atualmente, não há muito contato dos cubanos com o resto do mundo.

"É uma linhagem local, por enquanto. Não consigo prever se vai se expandir para fora ou não, mas se isso acontecer, então precisaremos nos preocupar."

Em Cuba, por enquanto, foram diagnosticados um total de 17.625 casos de HIV desde que a epidemia surgiu, na década de 1980, segundo dados da Infomed, site oficial da rede de saúde cubana.

A epidemia cubana é majoritariamente do sexo masculino - 80% de todos os infectados são homens. O Estado oferece atenção e tratamento gratuito a todos os infectados.

domingo, 3 de agosto de 2014

Ciro - o conto


A TV plásmica estava ligada ali na grande antessala e ninguém dava a ela a mínima atenção. Pessoas passavam em frente à tela flutuante na correria de suas vidas espirituais e mal se apercebiam das notícias apresentadas. Somente Ciro, olhava fixo a tela, mas não era possível saber se via ou ouvia o conteúdo da programação, tão distante era o seu olhar.

Uma linda repórter volitava diante de uma grande tela anunciando as manchetes do dia à população daquela esfera espiritual que abrigava, de acordo com o último censo diário, uma população de espíritos desencarnados vindos do Planeta Terra já por volta de 20 milhões de espíritos. Algumas pessoas chegavam mesmo a comparar a vida em Sólius com a vida na distante cidade terrena de encarnados no Brasil, São Paulo.

Não fosse pela excelência em sua organização e na paz que reinava por todas as vias da colônia, Ciro sempre achava aqui e acolá uma ou outra semelhança: a correria do dia-a-dia, o intenso tráfego de aerobuses que serviam aos espíritos ainda pouco acostumados à vida espiritual à qual haviam retornado, e que ainda precisavam se locomover com suas pernas, já que ainda não dispunham do conhecimento da volitação, e a tristeza no semblante de alguns cidadãos que circulavam pela cidade, aquilo lhe lembrava muito sua longínqua São Paulo.

A apresentadora e repórter vestia uma bela túnica azul que fazia movimentos majestosos de acordo com seus movimentos graciosos, enquanto volitava de um lado a outro da tela a mostrar imagens da própria colônia ou de outras colônias-irmãs.

- Não percam, hoje à noite, uma reportagem especial sobre famosos da esfera terrena. Nosso querido Cazuza, fala do reencontro com seu pai, João Araújo. A megastar, Whitney Houston, fala de seu envolvimento com as drogas no plano terreno e de suas histórias de vidas pregressas. E a grande revelação do século passado no Planeta Terra, Elis Regina, canta pra todos nós com sua divina voz, um pouquinho de seus últimos sucessos gravados e plasmados já aqui em nossa colônia, meus amigos.

Ciro sentia uma dor profunda em seu coração. Imagens da saudade que tinha da terra e de seus entes queridos vinham à sua mente a todo instante. Encontrava-se como que em um estado de torpor e ansiava por seu primeiro encontro semanal com o terapeuta, Dr. Sigmund. Sentia-se feliz por ter a seu dispor tanta tecnologia, conforto mesmo, coisa que jamais teve acesso em sua última vida, já que havia nascido em uma favela da zona sul de São Paulo e tudo que havia tido de mais valioso em sua vida havia sido um cachorrinho vira-lata chamado Billy e uma caixa de sapatos com a qual iniciou sua vida profissional quando contava não mais que 10 anos de vida na esfera terrena.

Aos 13, o crack já era seu companheiro diário, só ele lhe dava um pouco de liberdade, fazia-o flutuar por sobre seus sonhos e pensamentos, o transformava em qualquer coisa que quisesse ser: um médico, um cientista, um astronauta, qualquer coisa podia ele ser quando o crack lhe invadia o cérebro. Quantas vezes Ciro havia sido visto a conversar sozinho pelos faróis da cidade de São Paulo enquanto carregava uma pequena caixa de doces? Todos achavam que ele era louco, mas ele só estava sob efeito de alguma droga alucinógena que o permitia sentir menos dor e desconforto na tentativa de prosseguir com sua sofrida vida.

Aos 15, já se prostituía para comprar drogas. Ele se sentia atraído fisicamente por meninas, mas havia encontrado no sexo uma forma de ganhar dinheiro. Ia sempre a um parque na região da Avenida Paulista, o Parque Trianon, e lá se encontrava com senhores bem mais velhos, alguns poderiam ter sido seu avô, e se submetia a toda sorte de caprichos sexuais de seus clientes a troco de uns poucos trocados que imediatamente se transformavam em mais uma pedra de crack, e mais uma, e mais uma.

Aos 16, uma tosse chata não lhe deixava o corpo, sequer conseguia pegar no sono à noite. Os clientes reclamavam-lhe a falta de carne no corpo, já que alguns diziam-lhe que ele tinha que ter o que pegar. Não lhes bastava somente aquele grande naco de carne com o qual a natureza havia lhe presenteado entre as pernas, sentiam falta de suas curvas e de seus glúteos também avantajados, que já não se faziam mais se aperceber por entre seus ossos, muitos dos quais já expostos pela intensa magreza da qual ele havia sido acometido nos últimos meses. Chegou mesmo a perder alguns clientes, aqueles que lhe apreciavam a região glútea não nutriam por ele mais nenhum interesse, e consequentemente, não lhe davam mais dinheiro algum. Às vezes, ou melhor, muitas vezes, uma lata de cola para cheirar era a única coisa que lhe dava algum conforto já tarde da noite, quando o estômago lhe doía, reclamando por comida.

Ciro contraiu o vírus da AIDS aos 15 anos de idade, isso constava em seus registros no Ministério da Identidade de Sólius. Ele havia descoberto muito sobre si mesmo desde sua chegada 3 meses antes. Ainda havia muito a ser descoberto, pensava ele. Por que motivo havia tido uma vida tão desgraçada? Porque havia o tal Deus do qual todos lhe falavam ainda na Terra sido tão cruel com ele? Por que havia perdido os pais ainda criança, vítimas da droga e da AIDS? A mesma que lhe ceifara a vida aos 17 anos de idade terrenos? Por que tanto sofrimento? – pensava Ciro absorto em sua cadeira sem pés. Ele achava o máximo o fato de que os objetos em Sólius flutuavam como uma pirâmide que ele havia visto em uma reportagem do Fantástico ainda quando encarnado. Os cientistas que analisavam o fenômeno diziam que aquilo era uma farsa, a menos era isso que ele tinha entendido, que não havia na flutuação daquela pirâmide nada de encantado, que provavelmente ela era feita de um imã que estava em cima de um polo contrário, que a repelia, e aquilo dava à pirâmide a impressão de estar flutuando. Ele imaginava se aquela pirâmide que havia visto na TV não teria o mesmo tipo de tecnologia que os objetos de Sólius tinham. Alguém havia lhe dito dias antes que tudo que havia na Terra era uma cópia ainda mal feita de toda a tecnologia do mundo espiritual, que era muito mais avançado. Que as naves espaciais, as curas para as doenças, o celular, a internet, tudo havia sido inspirado na Terra por espíritos especialmente designados para encarnarem na Terra e levarem até eles o progresso e a tecnologia. O número de coisas, objetos, aparelhos, sensações do corpo e do cérebro aos quais Ciro tinha sido apresentado naqueles poucos mais de 3 meses em que estava em Sólius, lhe faziam imaginar o quanto ainda estavam atrasados na Terra e quanto tempo ainda demoraria para aquilo tudo estar disponível na esfera onde havia sido encarnado. Depois pensou e entendeu que aquele tipo de coisa era comum mesmo na Terra, ou seja, a tecnologia que os países desenvolvidos possuíam era muito aquém da tecnologia que seu próprio país, o Brasil, possuía. Por que haveria de ser diferente entre o Plano Espiritual e o Plano Físico, fazia sentido, pensava.

Foi trazido de volta de seus pensamentos por uma voz que o chamava de dentro da saleta onde o psicólogo estava.
- Entre, Ciro. Fique à vontade, sente-se, por favor. – disse-lhe o homem com silhueta de bonachão. Tinha um sorriso entre os lábios que lhe indicava a simpatia no espírito. Em que posso ajudá-lo, meu filho?
- Bem, doutor...eu não sei bem por que to aqui. Eu não tenho problema psisqui...psisqui...
- Psiquiátrico, Ciro?
- Sim, doutor, desculpa. To nervoso.
- Se acalme, meu filho.
- Tá, doutor. Bom, pelo que eu entendi, eu desencarnei porque tinha AIDS. Tudo começou quando... – o médico lhe interrompeu.
- Ciro, meu filho, você não precisa me dizer nada. Eu já sei tudo a seu respeito. Eu estou aqui para lhe orientar sobre a sua nova vida nesta colônia espiritual para espíritos vindos do Brasil.
Uma pequena lágrima formou-se nos olhos de Ciro. Ouvir aquilo, que havia morrido, era já sabido por Ciro, mas ele ainda não havia se acostumado com tudo, por mais que tentasse, era ainda tudo muito difícil.
- Ciro – continuou o terapeuta – você desencarnou vítima de uma tuberculose que se agravou por causa do vírus HIV que você tinha em seu organismo quando estava encarnado. Na verdade, você ainda teria vivido muitos anos, não fosse por sua resistência em tomar as medicações de acordo com a prescrição do seu médico terreno.
- Então eu morri antes da hora, doutor? – perguntou atônito com a revelação.
- Sim, meu filho. Não há milagre que possa ser feito, quando o doente, de qualquer que seja a doença, não faça sua parte. Você foi diagnosticado com tuberculose, sua resistência física já estava bem baixa quando a doença foi descoberta, e infelizmente, o uso das drogas não lhe permitia discernir sobre o que estava fazendo. Você não tomava os remédios, nem para a tuberculose, nem para controlar a multiplicação do vírus HIV em seu organismo. Foi isso que culminou no óbito de seu corpo físico.
- Cul o quê?
- Culminou, Ciro, foi o resultado, entende?
- Sim, entendo, doutor. Doutor, aqui as pessoas têm Aids também? Eu vi lá no hospital onde estive que tinha muitas gente que tavam doente. Eles gritavam de dor, eu mesmo sentia muita dificuldade pra respirar mesmo já tendo morrido. Isso é normal, doutor?
- Sim, Ciro, isto é perfeitamente normal. As sensações são trazidas para cá, enquanto a pessoa não se dá conta, não aceita que já não pertence mais àquele corpo que deixou lá na Terra, as sensações são as mesmas. Há dor, desconforto, sensação de fome, tudo que havia antes, porque estas sensações ainda estão no seu cérebro, entende?
- Entendo, doutor, mas agora não tenho mais fome da mesma forma que tinha. Tomo aí os líquido que dão pra mim tomar lá na casa aonde eu tô, e aquilo me faz sentir bem, sem fome.
- Sim, Ciro, você está certo. As sensações terrenas, todas, irão se dissipando pouco a pouco, conforme você se adequar mais e mais a esta nova atmosfera em que vive. Você está surpreso com o que eu lhe disse, não está?
- To sim, doutor. Eu achava que ia morrer mesmo, por isso não dei bola pras medicação que o médico me mandava tomar. Aqueles remédio que eu tinha que tomar todo dia pra tuberculose, doutor, era muito ruim, me dava um enjôo...os pra AIDs então, nem pensar! Minha boca ficava com gosto de lata, umas sensação estranha, sabe? Tinha caganera todo dia! Vivia mais nos mictório das rua do que debaixo dos meus cobertor. Quando eu num fazia nas rua mesmo! Era muito ruim, doutor! Se eu sabia que podia me curar, eu tinha tomado tudo direitinho, doutor...eu juro!
- Ciro, o que passou, passou. A AIDS nada mais é do que uma prova, uma prova que você mesmo pediu antes de nos deixar há 17 anos no tempo da Terra. Infelizmente você falhou nessa prova, mas não se lamente, meu filho, você passou em muitas outras!
- Mesmo, doutor? Eu tive uma vida desgraçada, doutor! Não fiz nada não...não servi pra nada...era só um nóia que passava o dia inteiro nas rua pedindo e me postrituindo...só isso.

O médico sorriu para ele, aproximou-se e tocou-lhe o ombro.

- Tá rindo do jeito que eu falo, né, doutor? Eu num tive instrução, nunca fui na escola.
- Eu sei, meu filho, não estou rindo de você, estou sorrindo para você. Com o passar do tempo, vamos nos ver semanalmente, você vai poder entender quanta coisa boa você fez em sua vida. Hoje eu vou conversar só mais um pouquinho com você, visto que este é nosso primeiro encontro, mas com o passar do tempo, todas as semanas, você será instruído na sua vida espiritual.Passará a se lembrar de coisas de outras vidas, que o trouxeram até esta, que acabou de terminar no plano terreno e reiniciar no plano espiritual, aqui em Sólis.

As lágrimas já caíam dos olhos de Ciro em abundância. Ele já não as segurava mais, não havia razão para isso, ele pensava. Ele estava liberto das dores terrenas e aos poucos livrava-se de sua ignorância que ainda impregnava seu espírito. Aos poucos as coisas passavam a fazer sentido pra ele, vagarosamente, mas de forma acalentadora ao seu espírito ainda impregnado de sensações terrenas. O doutor continuou:

- Quantas vezes você dividiu seu cobertor sujo com outro morador de rua nas noites frias de São Paulo, Ciro? Quantas vezes você foi acuado pelos seus parceiros de ruas a roubar das pessoas e negou-se a fazê-lo? Mesmo sabendo que corria perigo por isto? Quantas vezes você deixou de comer na sua infância para dar de comer à sua irmã mais nova, Ciro? Você salvou a vida de sua irmã várias vezes, Ciro. Você mudou a vida de uma criança quando naquela vez na Rua XV de novembro, alta madrugada, você não permitiu que ela usasse o crack pela primeira vez. E foi aquele seu ato, Ciro, que salvou a vida daquela criança. Hoje ele é um adolescente sadio, honesto e trabalhador. E nunca usou drogas, Ciro, graças a você, que incutiu em sua mente através de suas duras palavras o sentido do certo e do errado. Você usou sua própria miséria terrestre para dar de exemplo a uma criança e aquilo a marcou para o resto da vida. Impedindo que ela caísse no mundo das drogas.

Ciro chorava intensamente enquanto ouvia atentamente as palavras do psicólogo. Havia pela primeira vez em muitos anos, encontrado o significado da palavra autoestima, graças às palavras de alguém que lhe era totalmente estranho até então.

- Sabe, doutor. Eu descobri uns dia atrás que a gente pode trabalhar ajudando os encarnado quando tiver em condição, é verdade isso?
- Sim, Ciro, é verdade, o trabalho enobrece nossa missão tanto na Terra como aqui. Através do trabalho, da caridade, conseguimos dizimar inúmeros pensamentos e ações negativas que trazemos em nossos espíritos, uma vez que somos todos imperfeitos em constante trabalho de aprimoramento espiritual, meu filho.
- Então, doutor, eu queria, um dia, assim, quando dé, né? Trabalhar ajudando os portador a ser mais forte, sabe? A tomar os remédio, a num infectar as pessoa na hora que tão com a cabeça cheia de droga, estas coisa.
- Com certeza, Ciro. O trabalho de influência através de boas ideias e de inspiração feito por nós, espíritos, é enorme, as pessoas nem imaginam lá na Terra. Há um caso de um escritor, chamado Anderson Ferreira, que foi muito influenciado por nós ao escrever um livro contando às pessoas sobre sua experiência de vida como portador. Ele vive há muitos anos com o vírus, coisa que é possível a muitas outras pessoas, que infelizmente se deixam levar por ideias suicidas, não somente do suicídio como ato em si, mas no suicídio como falta de cuidado com o próprio corpo. Elas desistem muito facilmente, ou porque não se dão com os efeitos colaterais da medicação, que hoje em dia são pouquíssimos comparados ao que eram no final da década de 90, mas também porque temem mudanças em seus corpos físicos, mudanças estas, que às vezes são inclusive necessárias para que elas aprendam a lidar com sua missão como portadores, com suas vaidades, etc.
- Pôxa, doutor. Nunca tinha pensado nisso! Às vez a gente fica muito ligado nas aparência e se esquece do espírito, né, doutor? Se a gente soubesse que no espírito sempre somos bonito, a vida ia ser mais fácil lá na terra, num ia, doutor?
- Com certeza, Ciro, mas aí então não haveria mérito algum. O grande mérito é justamente o esquecimento da vida espiritual, para que façamos escolhas baseadas em nossa fé no Criador e em nosso Mestre Jesus. A fé salva, Ciro. Ninguém é vítima de nada, meu filho. Todos passamos por aquilo que temos que passar, uns mais, outros menos, dependendo de sua elevação espiritual, que nada tem a ver com bens materiais, beleza física, ou dotes de qualquer natureza. Você vai aprender sobre tudo isso, meu filho, ou melhor, vai se relembrar de tudo isso, aos poucos, tenha paciência. Agora nossa hora acabou, espero lhe encontrar aqui semana que vem no mesmo horário para darmos prosseguimento a nosso tratamento. Até mais – disse-lhe estendo-lhe a mão e exibindo um sorriso largo em seu rosto sereno.

Ciro saiu daquela sessão terapêutica renovado, lembrou-se de sua mãezinha, da qual havia se despedido na Terra antes mesmo de completar 4 anos de idade. Imaginou onde ela estaria, se estaria ali naquela colônia como ele, se estaria já de volta à Terra. Mas não se sentiu angustiado, pois sabia que todas as respostas estariam por vir de acordo com a permissão do Pai, para que ele continuasse sua missão de elevação espiritual, assim como todos nós.

Anderson Ferreira em 03 de agosto de 2014.