quinta-feira, 13 de março de 2008

Mais um ano se inicia hoje para mim!!!

Mesmo com a correria toda do trabalho eu não podia deixar de escrever um bocadinho aqui. Hoje é 13 de março de 2008. Pra mim um novo ano se inicia. Não se trata de Ano Novo chinês, trata-se de meu próprio aniversário de sobrevivência e nada melhor do que fogos de artifício para comemorá-los.
Em 13 de março de 1987 recebi aquele exame nas mãos me dando a tal sentença de morte que o médico do laboratório proferiu. Sentença de vida foi o que ele me deu sem saber, seu eu mesmo saber.
Foi naquele momento que percebi que se quisesse continuar teria que lutar, que sem luta nada se consegue nesta vida que vivemos. Já são 21 anos convivendo com esse vírus, aproximadamente 7665 dias, um pouco mais contando-se os anos bissextos. Aprendi muito nesses anos todos, cresci muito nesses anos todos, amadureci, envelheci mesmo. Sim, já não sou mais aquele jovenzinho inseguro que era aos 20 anos de idade quando segurei aquele pedaço de papel em minhas mãos.
A beleza física que chamava a atenção já não está mais comigo, a pele não é a mais a mesma...e os cabelos...bem...destes melhor nem comentar, pois não sobraram muitos. Modificada foi a textura capilar, bem como a textura de minh'alma...já não sou mais ingênuo como era, já não acredito mais que meus olhos azuis farão com que as pessoas se apaixonem por mim de forma incondicional, enfim, muitas coisas se foram, mas muitas coisas adquiri.
Adquiri experiência, e isto não tem preço. Aliás, não passa de um clichê dizer que experiência nessa vida é o que vale. Experiência é o que vale uma ova! Perder a viçosidade da pele, adquirir pneuzinhos chatos que insistem em aparecer toda vez que nos olhamos no espelho, isso tudo é um saco, mas é inevitável. Assim como inevitavelmente muitas coisas ruins são trazidas pelo vírus HIV em nosso organismo. Para uns mais, para outros menos, mas todos que convivem com este vírus bem sabem que fácil essa jornada não é.
Mais fogos porque estou feliz! Porque estou feliz e porque mereço!
Mas não se enganem aqueles que fazem de mim um herói imortal inserido em quatrocentas e poucas páginas de narrativa de uma vida que mal poderia ser narrada em poucos milhares de páginas, ou milhões, quem sabe? Se querem saber se estou feliz por completar mais esse aniversário de vida pós resultado HIV, a resposta é: sim, estou.
Mas como infelizmente não sou personagem de um livro criado pela imaginação de um autor talentoso qualquer só posso dizer que continuo minha luta, com alegrias e tristezas diárias, com sonhos, desilusões, muitas tristezas.
Só posso dizer que esta história de que portador do vírus HIV tem que ter qualidade de vida é pura balela. Tem sim que se ter qualidade de vida. Qualquer um que a esse mundo veio, mas é muito difícil.
Eu poderia ter me transformado em um eremita qualquer no intuito de me preservar, mas não o fiz. Porque a espiritualidade me ensinou (não gosto de falar de religião, mas cada um tem a sua, e eu tenho a minha filosofia de vida) que ao se isolar do mundo na ânsia de não pecar e não sucumbir às tentações vantagem alguma leva aquele que o faz.
Então continuo sofrendo como todos. Tenho que atingir metas irracionais no trabalho, respiro o ar poluído de São Paulo, fecho a janela do carro na tentativa absurda de me preservar da violência causada pelas injustiças sociais impostas por esse sistema político corrupto do qual todos nós somos vítima, sofro por amor, ou pela falta dele...sou apenas mais um aqui, como todos os outros também o são.
Mas sonho...visualizo...e como muitos outros...acredito...

domingo, 9 de março de 2008

Os jovens de ontem e hoje



Dia destes eu estava dando uma aula e me peguei falando algo que quase me fez dizer a todos coisas que não deveria ter dito. Tive vontade de dizer: Sabe, gente, eu sou seu professor, amo o que eu faço, sou soropositivo e gostaria muito que vocês soubessem de minha condição...sei lá entende...tipo assim (rs...)...acho muito importante que vocês todos tão jovens se cuidem, cuidem de sua saúde e se protejam desse maldito vírus HIV. Porque vocês têm toda a informação que eu não tive, a ciência evoluiu muito desde que eu descobri minha condição em 1987, mas ainda é muito difícil ser soropositivo neste país.
Estava lá eu falando de ícones da sociedade de todos os tempos e de repente apareceu a figura de James Dean entre todos os outros. Muitos poucos sabiam quem ele era, acho mesmo que dentre os 20 alunos somente 2 haviam falado do grande astro do cinema que morreu em um acidente automobilístico na metade da década de 50.
Percebi alguns risinhos quando comecei a falar sobre James Dean.

Não sei se foi paranóia da minha parte, mas era algo do tipo: esse professor tá mesmo véio, conhece até esse cara aí dos anos 50!
Confesso que fiquei um pouco bravo e tive vontade de dizer a eles que se sei das coisas é porque leio, me informo, etc...etc...mas isto só me tornaria um velho rabugento e não era essa minha intenção naquele momento...rs...
O engraçado é que dentre os ícones ali discutidos estava também um outro que dizia uma frase do tipo (a frase original era inglês, matéria que eu leciono): "A gente vive somente uma vez, e do jeito que vivo, uma vez é suficiente".
Como a atividade era descobrir qual daquelas pessoas famosas havia dito as frases, imediatamente a moçada a associou a James Dean. E estavam errados, quem havia dito tal frase havia sido Frank Sinatra.
Foi quando me peguei dizendo a eles que estavam errados, que James Dean jamais havia dito tal frase. Que mesmo tendo morrido aos 24 anos porque abusava da velocidade ao volante, ele muito provavelmente jamais havia achado que morreria em um acidente. E continuei...disse que quando somos jovens nos achamos imortais, sabemos, temos plena certeza que jamais morreremos antes de ficarmos bem velhinhos.
É como se tivéssemos um pacto com o cara lá em cima que nos protegesse em todas as situações. É por isso que nos arriscamos tanto quando somos jovens, vocês concordam? - perguntei a eles - e eles assentiram em uníssono.
Foi então que pensei em abrir o jogo e dizer a eles que comigo havia acontecido a mesma coisa quando tinha 19 anos. E no meu caso, só Deus sabe por quê, parece que o pacto havia funcionado, pois ainda estou aqui para contar as minhas histórias. Mesmo tendo adquirido um vírus mortal há 21 anos.
Depois me peguei pensando se eu me achava mesmo um super herói imortal quando tinha a idade deles. E a resposta veio como um relâmpago: sim.
Na verdade em 1987 se falava muito pouco em AIDS no Brasil, mas eu já havia ouvido falar a respeito, e podia ter me resguardado mais, mas não o fiz...justamente porque achei que comigo não aconteceria.
Em meu livro narro uma passagem triste, foi a perda de meu melhor amigo à época. Morreu em um acidente de carro na Via Dutra aos 18 anos de idade. Ele sequer sabia dirigir, nem sei bem como aconteceu o acidente, mas fico agora pensando se o amigo dele que estava ao volante sofria da mesma síndrome da juventude imortal da qual todos nós um dia já sofremos.